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Scientific Society Journal
ISSN: 2595-8402
Journal DOI: 10.61411/rsc31879
REVISTA SOCIEDADE CIENTÍFICA, VOLUME 7, NÚMERO 1, ANO 2024
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ARTIGO ORIGINAL
Contaminação microbiológica em cosméticos capilares: uma revisão integrativa
Kessiane Belshoff de Almeida1; Julia Balestrero Braga Nunes2
Como Citar:
DE ALMEIDA, Kessiane Belshoff; NUNES, Julia Balestrero Braga. Contaminação microbiológica em cosméticos capilares: um revisão integrativa. Revista Sociedade Científica, vol.7, n. 1, p.3111-3138, 2024.
https://doi.org/10.61411/rsc202462217
Área do conhecimento: Ciências da Saúde.
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Sub-área: Microbiologia.
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Palavras-chaves: Contaminação microbiológica; Contaminação microbiana; Cosméticos capilares; Deterioração de produtos capilares; Contaminação de produtos de higiene pessoal.
Publicado: 11 de julho de 2024.
Resumo
Os cosméticos capilares fazem parte da rotina diária de cuidados desde a infância até a vida adulta, tornando sua avaliação microbiológica de grande importância em termos da segurança para o consumidor e do padrão de qualidade do produto, uma vez que a presença de elevada carga microbiana pode resultar em problemas para a saúde. O objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão da literatura integrando os diferentes relatos de contaminação microbiana em cosméticos capilares, a fim de identificar as espécies microbianas de maior predominância e seu impacto para o produto e para o usuário. A metodologia consistiu em revisão integrativa e descritiva da literatura, utilizando as bases de dados SciELO, PubMed, Science Direct e Google Scholar, avaliando-se trabalhos publicados de março de 2004 a junho de 2024. Foram selecionados 10 artigos para a revisão, por meio da qual constatou-se que muitas formulações capilares disponíveis no mercado apresentam problemas de qualidade microbiológica, especialmente formulações de xampus e condicionadores, sendo os microrganismos mais encontrados Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus, Bacillus sp e, coliformes totais e fecais. Logo, estes resultados revelam falhas nas etapas de seleção do sistema conservante, na adoção de boas práticas de fabricação e de controle de qualidade. Isto posto, é essencial que as indústrias cosméticas sigam com rigor todos os requisitos técnicos recomendados pelas agências regulatórias de modo a disponibilizar para o mercado produtos direcionados aos cuidados dos cabelos com garantia de segurança, eficácia e qualidade, visando a manutenção da saúde e do bem-estar dos consumidores.
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ABSTRACT
Hair cosmetics are part of the daily care routine from childhood to adulthood, which makes the microbiological evaluation of said products of great importance in terms of consumer safety and product quality standards, since the presence of a high microbial load can lead to health problems. The aim of this analysis was to conduct a literature review, integrating the different reports of microbial contamination in hair formulations, indicating the most predominant microbial species and their consequences for both consumer and the product itself. The methodology consisted of an integrative and descriptive review of the literature, using databases such as SciELO, PubMed, Science Direct and Google Scholar and evaluating documents published from March 2004 to June 2024. 10 articles were selected for the review, which has found that many hair cosmetics available on the market display microbiological quality issues, especially shampoo and conditioner formulations, with the most commonly found microorganisms being Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus, Bacillus sp and total and fecal coliforms. Accordingly, these results reveal failures in the stages of selecting the preservative system and adopting good manufacturing practices and quality control. Hence, it is extremely important that cosmetic industries strictly follow all technical requirements recommended by regulatory agencies in order to make hair care products available to the market with safety, efficacy and adequate quality to preserve end consumers health and well-being.
Keywords: Microbiological contamination; Microbial contamination; Hair cosmetics; Hair products deterioration; Toiletry contamination.
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1. Introdução
O Brasil é um dos maiores mercados consumidores de produtos cosméticos no mundo, os quais exibem enorme diversidade de fórmulas e diferentes aplicações. Tais produtos apresentam composição química rica em nutrientes, fazendo deles altamente susceptíveis ao crescimento microbiano, principalmente quando formulados com elevado teor de água e matérias-primas de origem natural. Dessa forma, a presença de alta carga microbiana em formulações cosméticas ocasiona alterações na estabilidade do produto, inativação de substâncias, mudanças no pH e em características organolépticas, tais como cor, odor e textura, além de acarretar prejuízos econômicos e comprometer a reputação da empresa no mercado [1].
A contaminação microbiana nos produtos cosméticos pode ser proveniente do ar, dos materiais de embalagem primária, equipamentos e utensílios de produção, das matérias-primas, da água utilizada no processo, do ar comprimido e/ou do pessoal envolvido nas etapas operacionais [2]. A proliferação microbiana no produto pode ocorrer também durante o uso, demonstrando falhas durante a etapa de seleção do sistema conservante, o qual tem por objetivo aumentar o tempo de vida útil da fórmula, impedindo o crescimento de microrganismos durante a produção, armazenamento e utilização pelo consumidor [3].
No Brasil, as especificações microbiológicas para produtos cosméticos encontram-se descritas na Resolução de Diretoria Colegiada Nº 752, de 19 de setembro de 2022 (RDC 752/22), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a qual os classificam em Tipo I e Tipo II conforme a função, o local de aplicação e a faixa etária de uso. Conforme o referido regulamento, coliformes totais e fecais, bem como Pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus aureus devem estar ausentes em 1 g ou 1 mL de produto [4]. É responsabilidade do fabricante ou do importador a garantia da segurança e da eficácia do produto aos usuários em condições normais ou razoavelmente previsíveis de uso, visto que os cosméticos são produtos de livre acesso [5].
Em suma, a presente análise teve por objetivo avaliar e integrar relatos de contaminação microbiana em formulações capilares nos últimos 20 anos, apontando os microrganismos mais comumente encontrados e pontuando as consequências tanto para o produto quanto para o usuário.
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2. Metodologia
O presente trabalho consiste em uma revisão da literatura científica com abordagem descritiva e explicativa. A seleção desta metodologia deve-se à sua capacidade de sintetizar e analisar o conhecimento científico previamente revelado sobre o tema em questão. Neste sentido, a condução da presente análise foi disposta em seis etapas, a saber: (1) estabelecimento da pergunta norteadora; (2) definição dos critérios de inclusão e exclusão; (3) coleta de dados; (4) avaliação crítica dos trabalhos incluídos; (5) interpretações dos resultados e (6) apresentação da revisão integrativa.
Para nortear a pesquisa, a seguinte pergunta foi estabelecida: Quais as principais espécies microbianas de maior predominância em produtos capilares e seu respectivo impacto para o produto e para o usuário?
Para seleção dos trabalhos foram utilizadas as bases de dados SciELO, PubMed, Science Direct e Google Scholar, sendo utilizadas para a busca as palavras-chave microbiological contamination, microbial contamination, hair cosmetics, hair products deterioration e toiletry contamination, associadas aos operadores booleanos “AND, NOT e OR”. Este mesmo procedimento foi realizado para estas mesmas palavras-chave em língua portuguesa.
Os critérios de inclusão das publicações para esta revisão foram artigos originais, artigos de revisão e relatos de caso, publicados no período de março de 2004 a junho de 2024, disponíveis em língua portuguesa ou inglesa, contemplando o tema abordado. Para complementar as discussões acerca do tema, realizou-se, ainda, a consulta de livros especializados, guias e normas técnicas disponíveis em sítios eletrônicos de órgãos oficiais. Foram adotados como critérios de exclusão os trabalhos não relacionados ao tema, bem como aqueles repetidos nas bases de dados e com acesso não disponível.
Inicialmente 643 artigos foram identificados como potencialmente elegíveis. Deste total, 556 artigos foram diretamente excluídos por não incluírem estudos de caso que fossem de relevância para a temática estabelecida. Avaliação detalhada com base no título dos artigos remanescentes foi efetuada e 54 artigos foram descartados por não se adequarem ao escopo. Em sequência, o resumo de cada um dos documentos remanescentes foi criteriosamente estudado, sendo assim, um novo refino foi efetuado e 16 documentos foram excluídos por não revelarem o conteúdo relativo a este trabalho. Por fim, após realizar uma leitura na íntegra dos últimos artigos selecionados, 7 documentos foram descartados por não apresentarem estudos de caso relevantes para o referido tema. Dessa forma, apenas 10 artigos foram selecionados para a revisão integrativa, conforme ilustrado no fluxograma Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) da Figura 1.
Figura 1. Fluxograma de seleção dos trabalhos incluídos na revisão integrativa.
A Tabela 1 apresenta os 10 artigos selecionados para a revisão, organizados em ordem cronológica do mais antigo para o mais recente, contendo a numeração atribuída ao trabalho, a base de dados, os autores, o ano de publicação e o título. Dos 10 artigos selecionados para a presente pesquisa, 7 foram da base de dados Google Scholar, 2 foram da base de dados Science Direct e apenas 1 foi encontrado na plataforma PubMed. Os artigos apresentaram em comum estudo de caso relacionado a formulações capilares disponíveis no mercado com problemas de qualidade microbiológica, especialmente formulações de xampus e condicionadores, sendo os microrganismos mais encontrados Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus, Bacillus sp e, coliformes totais e fecais.
Tabela 1. Publicações incluídas na revisão integrativa, incluindo o período de março de 2004 a junho de 2024, abordando contaminações microbiológicas em cosméticos para aplicação nos cabelos e couro cabeludo.
Número | Base de dados | Autores/ano | Título |
I. | Google Scholar | Razooki, Saeed e Hamza (2009) | A Study on Cosmetic Products Marketed in Iraq: Microbiological Aspect |
II. | Google Scholar | Rosa et al (2015) | Análise microbiológica de xampus e cremes condicionadores para uso infantil |
III. | Google Scholar | Neza e Centini (2016) | Microbiologically contaminated and over preserved cosmetic products according Rapex 2008–2014 |
IV. | Google Scholar | Rocha (2016) | Análise de qualidade microbiológica e físico-química de cremes hidratantes capilares comerciais em uso |
V. | Google Scholar | Vieira, Moreira e Frizzo (2017) | Análise microbiológica em formulações de xampu: o controle da qualidade em produtos com e sem conservantes |
VI. | Google Scholar | Godbole e Choubey (2019) | Microbial contamination of commercial cosmetic products – a review on methods for evaluation of microbiological safety and guidelines governing the quality |
VII. | Google Scholar | Teodoro, Torres e Barbosa (2019) | Avaliação microbiológica dos produtos de higiene pessoal das indústrias de cosméticos de Goiânia e região metropolitana |
VIII. | PubMed | Almukainzi et al (2022) | Quality and safety investigation of commonly used topical cosmetic preparations |
IX. | Science Direct | Shaqra e Al-Groom (2022) | Microbiological quality of hair and skin care cosmetics manufactured in Jordan |
X. | Science Direct | Alshehrei (2024) | Quality Assessment of Skin and Body care Cosmetics by using Challenge test |
3. Desenvolvimento e discussão
3.1. Cosméticos capilares: parâmetros de controle microbiológico
O mercado mundial de cosméticos encontra-se em constante expansão e, segundo panorama apresentado em junho de 2024 pela Associação Brasileira das Indústrias de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC), o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking dos países consumidores, perdendo apenas para os Estados Unidos, China e Japão. Na classificação de produtos por categoria, os produtos capilares também ocupam a quarta colocação [6].
Os cuidados com os cabelos são relatados desde os primórdios da humanidade. No Egito, múmias com cabelos tingidos de vermelho por henna foram encontradas em escavações arqueológicas e, no Império Romano, pentes contendo sulfeto de chumbo que produziam coloração escura em contato com o vinagre eram utilizados para tingir de preto os fios grisalhos. Na Itália, durante o período renascentista, os italianos mergulhavam os cabelos em decocções de cinzas e as expunham ao sol por algumas horas para clareamento dos fios [7].
Os cabelos atuam na proteção da cabeça contra raios solares e outros fatores externos, bem como desempenham importante papel psicológico no processo de autopercepção e autoestima de homens e mulheres [7]. Em toda a história da civilização humana, os cabelos e suas modificações ao longo do tempo, exibiram grande destaque tanto em rituais como em questões socioculturais, apresentando-se como um símbolo de sedução e status [8].
Os cosméticos capilares são definidos como preparações colocadas em contato com o cabelo e o couro cabeludo, tendo como finalidade realizar a limpeza, alterar a aparência, promover a atratividade e/ou oferecer proteção, a fim de mantê-los em boas condições [9]. Em determinadas circunstâncias, formulações cosméticas podem ser utilizadas como adjuvantes à tratamentos médicos, trazendo benefícios não apenas clínicos, mas também psicológicos para os usuários [10].
Diferentes técnicas e produtos cosméticos para aplicação capilar vêm sendo desenvolvidos e comercializados, desde os tempos antigos, com variadas tecnologias incorporadas para alterar e melhorar a aparência, a cor, a textura e o estilo dos cabelos [10]. Esta enorme diversidade de produtos causa preocupação para os órgãos de vigilância sanitária no que se refere ao aspecto microbiológico dos produtos disponibilizados no mercado. Em vista disso, a Anvisa estabeleceu requisitos para o controle microbiológico de produtos cosméticos por meio da publicação da RDC 752/22, que estabelece os parâmetros de controle microbiológico para os produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes. Os cosméticos são classificados de acordo com a faixa etária, a função e o local de aplicação em tipos I e II, sendo em ambos os tipos admitido um número limitado de microrganismos viáveis, bem como a ausência de espécies patogênicas em 1 g ou 1 mL do produto, conforme apresentado na Tabela 2 [4]. Embora a legislação especifique os patógenos a serem pesquisados nos cosméticos, isso não isenta os fabricantes de efetuarem a identificação de outras espécies questionáveis diante dos possíveis riscos para o produto e para a saúde do consumidor [11].
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Tabela 2. Subgrupos de produtos cosméticos e parâmetros microbiológicos especificados pela RDC N° 752/2022, da Anvisa.
Tipos | Área de aplicação e faixa etária | Limites microbiológicos aceitáveis |
I | Produtos para uso infantil | a. Contagem de microrganismos mesófilos totais aeróbios: não mais que 10² UFC/g ou mL, sendo o limite máximo igual a 5,0 x 102 UFC/g ou mL; b. Ausência de Pseudomonas aeruginosa em 1 g ou 1 mL; c. Ausência de Staphylococcus aureus em 1 g ou 1 mL; d. Ausência de Coliformes totais e fecais em 1 g ou 1 mL; e. Ausência de Clostrídios sulfito redutores em 1 g – exclusivamente para talcos. |
Produtos para área dos olhos | ||
Produtos que entram em contato com mucosas | ||
II | Demais produtos susceptíveis a contaminação | a. Contagem de microrganismos mesófilos totais aeróbios: não mais que 10³ UFC/g ou mL, sendo o limite máximo igual a 5,0 x 10³ UFC/g ou mL; b. Ausência de Pseudomonas aeruginosa em 1 g ou 1 mL; c. Ausência de Staphylococcus aureus em 1 g ou 1 mL; d. Ausência de Coliformes totais e fecais em 1 g ou 1 mL; e. Ausência de Clostrídios sulfito redutores em 1g – exclusivamente para talcos. |
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3.2. Fontes de contaminação microbiana na indústria cosmética
Na natureza é encontrada uma grande variedade de microrganismos, muitos dos quais são capazes de sobreviver em ambientes inóspitos ou em condições hostis, como em locais com baixa disponibilidade de nutrientes ou com faixas extremas de pH e umidade [2].
Devido a sua composição, as formulações cosméticas constituem uma excelente fonte de nutrientes para o crescimento de microrganismos. Álcool, ceras, lipídios, proteínas, polissacarídeos, vitaminas e proteínas são excipientes frequentemente empregados nestes produtos e funcionam como substratos para o metabolismo microbiano [12]. Produtos que contenham matérias-primas de origem natural e com elevado teor de água apresentam maior susceptibilidade à contaminação microbiana em relação aos demais ([13]; [3]). Assim, as exigências nutricionais dos microrganismos e as características físico-químicas das preparações capilares devem ser consideradas no delineamento e no controle de qualidade dos produtos, de maneira que ações preventivas sejam assertivamente implementadas para reduzir o risco de contaminação [2].
A maioria das espécies microbianas causadores de infecções humanas são neutrófilos, ou seja, crescem em faixa de pH entre 5,5 e 8,0. Logo, cosméticos capilares que exibem pH abaixo ou acima destes valores apresentam menor susceptibilidade ao crescimento de microrganismos. Formulações com baixo conteúdo de água incorporado, como xampus e condicionadores sólidos, também não oferecem riscos pronunciados de contaminação, uma vez que a água é um pré-requisito para o crescimento de bactérias e fungos. Apesar de tais características restringirem o desenvolvimento da maior parte dos patógenos, é aconselhável que essas formulações apresentem em sua composição conservantes devido ao potencial de esporulação de alguns microrganismos, tais como aqueles dos gêneros Bacillus, Clostridium e Aspergillus [2].
A qualidade da água usada na produção de cosméticos é um aspecto crítico e que exige rigor em termos de especificações físicas, químicas e microbiológicas [14]. Em produtos capilares líquidos e semissólidos, a água consiste no excipiente que aparece em maior proporção na fórmula e, por isso, tais preparações são altamente vulneráveis à contaminação microbiana. Cremes formulados como emulsões água em óleo, com altas concentrações de soluto e valores reduzidos de atividade de água são propícios para o crescimento de fungos. Além de fungos, também são encontradas contaminações por leveduras em produtos oleosos, géis, soluções e cremes [15]. Os patógenos bacterianos são mais prevalentes em relação aos fúngicos, sendo as mais encontradas aquelas do gênero Pseudomonas e Burkholderia, bem como os coliformes totais e fecais [14].
Na formulação de produtos cosméticos certos excipientes são adicionados para evitar degradações químicas e microbiológicas, bem como propiciar aumento de estabilidade e qualidade. Dentre estes excipientes temos os agentes antioxidantes, quelantes, conservantes e tamponantes. Considerando-se que as reações degradativas são resultado da exposição ao oxigênio e da proliferação de microrganismos no produto, faz-se necessário a incorporação à fórmula de sistemas antioxidantes e conservantes efetivos. Os quelantes são substâncias orgânicas ou inorgânicas que formam complexos solúveis, não tóxicos e estáveis com metais. Desta forma, estes excipientes inativam íons metálicos, como cálcio, cobre, magnésio e ferro, que catalisam as reações oxidativas e são provenientes da água e das demais matérias-primas naturais empregadas na fórmula, assim como de aparatos de fabricação e recipientes de acondicionamento. Em cosméticos, os quelantes mais rotineiramente utilizados nas preparações são o ácido etilenodiamino tetra-acético (EDTA), ácido lático, ácido fítico e ácido glutâmico. Os quelantes são comumente empregados em associação com antioxidantes, uma vez que apresentam efeitos sinérgicos. Além de atuar na prevenção da oxidação do produto cosmético, os quelantes podem potencializar a ação de antimicrobianos e a eficácia das conservantes, o que se torna relevante em termos de resistência microbiana. Na presença de agentes quelantes, o microrganismo apresenta-se mais sensível, visto que cátions polivalentes da célula microbiana ao serem complexados modificam a sua estabilidade e facilitam a permeação de substâncias com atividade antimicrobiana. Adicionalmente, a retirada de metais importantes para o metabolismo da célula contribui para a atividade antimicrobiana [14].
A grande maioria dos cosméticos para uso capilar são produtos multiuso que precisam ser formulados para que, durante os diversos momentos em que a embalagem do produto for aberta, os níveis de contaminação mantenham-se reduzidos, devendo ser eficientes frente aos microrganismos que entrarem em contato com o produto após a abertura da embalagem [16]. Assim, a seleção do tipo e concentração ideal dos conservantes é o ponto mais importante no desenvolvimento de uma formulação cosmética com vista a minimizar os riscos microbiológicos. A adição de conservantes tem por objetivo aumentar o tempo de vida útil da fórmula, impedindo o crescimento de microrganismos capazes de promover modificações no produto final e até mesmo causar infecções no usuário ([17]; [3]). Os conservantes devem propiciar a manutenção da qualidade microbiológica da preparação cosmética durante as etapas de produção, armazenamento e uso do produto [14]. Dessa forma, os fabricantes precisam submeter as formulações, durante o estágio de desenvolvimento, ao teste de eficácia do sistema conservante, desafiando o produto com cepas microbianas, a fim de avaliar a sua estabilidade microbiológica [11].
É importante salientar que o emprego de sistemas conservantes às formulações cosméticas não deve ser utilizado como substituto às Boas Práticas de Fabricação (BPF), mas sim como uma estratégia complementar para garantir a qualidade do produto final [2]. A escolha adequada do sistema conservante e a implementação de BPF são ações imperativas para a garantia da estabilidade e da segurança microbiológica do cosmético [14].
Nas áreas de produção de cosméticos, apresentam-se como fontes de contaminação microbiológica o ar, a água, os materiais de embalagem e as matérias-primas usadas no preparo, principalmente aquelas de origem natural. Neste sentido, testes microbiológicos devem ser realizados nas matérias-primas, operações unitárias precisam ser implementadas, procedimentos de limpeza e sanitização devem estar validados e o ambiente de produção precisa ser continuamente monitorado a fim de minimizar a proliferação de bactérias e fungos [14].
Ainda no contexto de BPF, a introdução de microrganismos aos produtos pode ocorrer pelos próprios operadores e demais pessoas que acessam as áreas durante a fabricação do lote. Dessa forma, todo o pessoal envolvido na produção deve receber treinamento contínuo quanto a correta paramentação e adoção de procedimentos assépticos, de maneira a não representarem uma fonte de contaminação microbiológica ([18]; [14]). Falha neste quesito pode ser constatada, por exemplo, quando são isolados cocos Gram-positivos no produto, como espécies de estafilicocos e micrococos [11].
Cabe salientar que as indústrias cosméticas são responsáveis por toda a cadeia do produto desde a sua fabricação até o uso pelo consumidor final. Muitas formulações são acondicionadas em recipientes de boca larga e sem a disponibilização ao usuário de utensílios para a retirada do produto da embalagem, de modo a evitar o contato com as mãos, a qual se constitui como uma importante fonte de contaminação. Cabe aos fabricantes, no momento de desenvolvimento do produto, priorizar embalagens que limitem ao máximo o contato do consumidor com o produto. Além disso, é primordial que as formulações sejam submetidas adequadamente à etapa de avaliação do sistema conservante, de forma a garantir a sua efetividade em restringir a proliferação microbiana, e que sejam disponibilizadas informações adequadas para o correto uso do produto [19].
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3.3. Consequências da contaminação microbiana
A pele e as mucosas atuam como barreiras mecânicas do corpo, protegendo-o do ataque de microrganismos por mecanismos de defesa imunológica. Contudo, quando estas barreiras são alteradas, como no caso de dermatite atópica, traumas mecânicos ou queimaduras, a função de proteção da pele é comprometida, aumentando a probabilidade de ocorrência de infecções devido ao uso de cosméticos contaminados microbiologicamente. Dessa forma, em indivíduos saudáveis a presença de contaminação pode não oferecer riscos à saúde, todavia, em crianças, idosos e pacientes imunossuprimidos essa pode resultar em infecções de elevada relevância clínica. Por isto a importância de avaliação da finalidade, condições de uso, frequência e tempo de exposição ao cosmético ([20]; [1]).
A ocorrência de concentrações altas de patógenos oportunistas e concentrações baixas de toxinas bacterianas nocivas que sobrevivem no produto por longos períodos são consideradas como as principais causas de alterações em cosméticos. A presença de contaminação microbiana pode resultar em modificações de características físicas, químicas e organolépticas, como cor, odor, aparência e textura, comprometendo a estabilidade da formulação. Além disso, pode haver alteração ou perda de atividade de constituintes da formulação e produção de substâncias tóxicas ([1]; [21]).
A deterioração microbiológica de uma formulação cosmética normalmente é caracterizada pela presença de bolor (fungo filamentoso), mudança de cor do produto, deformações na embalagem primária e/ou vazamento resultante da produção de gás pelo metabolismo microbiano. Estas alterações ao serem identificadas no produto por parte do consumidor, possivelmente irão o desencorajar a realizar uma nova compra, comprometendo a reputação da empresa perante o mercado e trazendo prejuízos econômicos consideráveis. Os xampus, que possuem tensoativos em sua composição, por exemplo, são altamente susceptíveis à contaminação por bactérias Gram-negativas presentes na água, podendo comprometer, assim, a formação de espuma. Perda da funcionalidade de excipientes adicionados à formulação também pode ser verificada como resultado da proliferação de microrganismos [22].
Em formulações líquidas as alterações visíveis resultantes da proliferação de microrganismos consistem na presença de sedimentos viscosos, turbidez e películas, enquanto em formulações sólidas e semissólidas verifica-se a formação de colônias coloridas. Colônias amarelo brilhante em um creme capilar branco pode, por exemplo, indicar o crescimento de micrococos no produto. Alterações de cor no cosmético também são observadas quando há a presença de Pseudomonas aeruginosa. Isto pode ser resultado da ação metabólica dos microrganismos sobre constituintes do produto, ou
mesmo por modificações em parâmetros como pH ou oxidação-redução [22].
Cremes e loções são cosméticos do tipo emulsão, tendo os primeiros uma consistência mais espessa. Emulsões bifásicas semissólidas do tipo óleo em água exibem maior risco de contaminação, por serem formuladas com maior proporção de água, ambiente este ideal para a proliferação de microrganismos [23]. Nas formulações capilares emulsionadas, o crescimento microbiano pode acarretar a lipólise da fase oleosa ou alteração do pH da fase aquosa. Assim, as emulsões tornam-se mais fluidas, separam-se, descoloram-se ou mudam de cor, apresentando-se visivelmente heterogêneas ([22]; [20]). Pseudomonas spp., por exemplo, pode liquefazer a gelatina e decompor hidrocarbonetos e gorduras, alterando as emulsões [24].
Formulações cosméticas capilares que possuem celulose como excipiente principal, como é o caso de alguns cremes, quando contaminadas por Fusarium spp.; Aspergillus spp. e Penicillium spp., apresentam-se como uma massa de consistência escorregadia. Tais espécies fúngicas produzem enzimas hidrolíticas, como β-glucosidase, exo-β-1,4-glucanase e endo-β-1,4-glucanase que utilizam a celulose cristalina como substrato [24]. Microrganismos podem causar a despolimerização de agentes espessantes, como a carboximetilcelulose (CMC), levando à perda de viscosidade e à sedimentação de excipientes suspensos. Por outro lado, o crescimento de bactérias e fungos pode causar a polimerização de tensoativos e açúcares que compõem a formulação capilar [20].
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3.4. Contaminações microbianas relatadas nos últimos 20 anos
Avaliação crítica e integrativa de trabalhos publicados de 2004 a 2024 foi realizada a fim de analisar a qualidade microbiológica dos cosméticos capilares comercializados no mercado. Na Tabela 3 estão apresentados alguns estudos que foram publicados no período acima especificado, com os tipos de formulações cosméticas e os microrganismos contaminantes. Verifica-se que as bactérias Gram-negativas estão presentes na maioria dos relatos de contaminação microbiológica de cosméticos capilares. A espécie bacteriana mais predominante nos trabalhos foi a Pseudomonas aeruginosa. Outras espécies relevantes foram Staphylococcus aureus, Bacillus sp. e as enterobactérias.
Tabela 3. Tipos de preparações cosméticas capilares e microrganismos isolados em trabalhos publicados no período de 2004 a 2024.
Produto contaminado | Microrganismos | Referência bibliográfica |
a. Xampu sem inativação do sistema conservante; b. Xampu com inativação do sistema conservante; c. Creme condicionador sem inativação do sistema conservante, e d. Creme condicionador com inativação do sistema conservante | a. Bactérias: SCN e Bacillus sp; Fungos: Penicillium sp e Cladosporium sp; b. Bactérias: SCN, Bacillus sp, Corynebacterium sp e Rhodococcus sp; Fungos: Penicillium sp e Cladosporium sp; c. Bactérias: SCN e Bacillus sp; Fungos: Cladosporium sp e Acremonium sp; d. Bactérias: SCN, Bacillus sp e Corynebacterium sp; Fungos: Cladosporium sp e Acremonium sp. | Rosa et al (2015) |
Xampus manipulados com e sem a adição de sistema conservante. | Staphylococcus aureus, Salmonella sp., Pseudomonas aeruginosa e Escherichia coli. | Vieira, Moreira e Frizzo (2017) |
Creme, xampu, tintura de cabelo e sérum capilar. | Staphylococcus aureus e Bacillus sp. | Almukainzi et al (2022) |
Xampu | Pseudomonas sp, Shigella sp e coliformes fecais. | Razooki, Saeed e Hamza (2009) |
Xampu, gel modelador, óleo e alisante de cabelo | Staphylococcus aureus, Pseudomonas aeruginosa e Bacillus sp. | Godbole e Choubey (2019) |
Xampu e condicionador de cabelo | Staphylococcus spp, Micrococcus spp, Streptococcus spp, Bacillus spp, Escherichia coli e Pseudomonas spp, Aspergillus spp e Penicillium spp. | Alshehrei (2024) |
Xampu, condicionador, gel modelador, emulsão reparadora e produto de cuidados diários. | Pseudomonas spp, Escherichia coli, Staphylococcus aureus, SCN, Enterobacter spp., Micrococcus spp, Serratia spp, Alcaligenes spp, Bacillus spp. | Shaqra e Al-Groom (2022) |
Creme hidratante capilar | Pseudomonas aeruginosa | Rocha (2016) |
Xampu e condicionador | Pseudomonas aeruginosa | Teodoro, Torres e Barbosa (2019) |
Corantes naturais de cabelo, Xampus, Xampu herbal, Xampu infantil, Corantes de cabelo, | Pseudomonas aeruginosa, Citrobacter freundii, Enterobacter cloacae, Enterobacter gergoviae, Pseudomonas putida, Serratia marcescens e Klebsiella pneumoniae | Neza e Centini (2016) |
Legenda: SCN - Staphylococcus coagulase-negativa.
A Pseudomonas aeruginosa é um bacilo aeróbico oportunista, geralmente presente em ambientes naturais como solo e água, que muitas vezes apresenta resistência aos conservantes rotineiramente utilizados nas formulações. As infecções nosocomiais causadas por este patógeno podem afetar o ouvido médio e externo, as feridas de queimaduras e o trato respiratório, principalmente em pacientes com fibrose cística e submetidos cronicamente à ventilação mecânica. Ceratite bacteriana, infecções do trato urinário e fasceíte necrosando são também relatadas [25]. Os quadros infecciosos causados por Pseudomonas aeruginosa são de elevada relevância clínica, devido a expressão de genes de múltipla resistência a antibacterianos, associada a difícil erradicação da doença com altos índices de morbidade e mortalidade [26]. Esta bactéria patogênica foi encontrada em amostras de cremes de hidratação em uso para os cabelos em estudo realizado por [19]. De 18 amostras de xampus e condicionadores fabricadas por indústrias de Goiânia e região, 11,11% delas apresentaram contaminação fúngica e bacteriana acima dos limites especificados pela legislação em vigor, sendo Pseudomonas aeruginosa um dos microrganismos presentes nos cosméticos [1].
A legislação europeia assemelha-se à brasileira no que se refere aos limites máximos de microrganismos aeróbios mesófilos totais e aos patógenos que devem estar ausentes em produtos cosméticos. Tendo-se esta referência, houve o registro de aproximadamente 104 produtos cosméticos com riscos microbiológicos na base de dados Rapid Exchange of Information System (RAPEX), no período de 2008 a 2015, sendo este um sistema de alerta rápido da Comissão Europeia para produtos perigosos não alimentares que são vendidos nos mercados dos países pertencentes à União Europeia. A Pseudomonas aeruginosa foi o microrganismo mais encontrado nos cosméticos, presente em 21 produtos, e mais especificamente em 6 xampus. Outro microrganismo identificado em xampu de uso infantil foi o Enterobacter gergoviae, uma bactéria naturalmente resistente aos parabenos nas concentrações utilizadas nas formulações cosméticas. Serratia marcescens, uma enterobactéria Gram-negativa, também foi encontrada em xampus de uso infantil, causando a morte de um bebê por meningite e septicemia. Outra enterobactéria, relatada em xampus para bebês foi a Klebsiella pneumoniae, microrganismo causador de casos graves de pneumonia [12].
Razooki, Saeed e Hamza [22] avaliaram 60 produtos cosméticos, sendo identificada contaminação microbiológica em 26,4% deles. O nível mais elevado de contaminação foi encontrado em xampus, sendo identificado a presença de Pseudomonas sp, Shigella sp e coliformes fecais. Como previamente apresentado, a maioria dos microrganismos tem crescimento favorecido em pH de 5,5 a 7,0 e em ambientes com alto teor nutricional, sendo estas características encontradas em xampus. Esta informação é condizente com os resultados obtidos pelos autores. O estudo evidenciou, ainda, o fato de xampus serem as preparações capilares mais suscetíveis à contaminação por bactérias Gram-negativas transmitidas pela água em comparação aos demais tipos de formulações para os cabelos, uma vez que contêm concentrações significativas de tensoativos na fórmula.
Conforme apresentado na Tabela 2, os produtos cosméticos para uso infantil apresentam maior rigor em termos de contagem de microrganismos aeróbios mesófilos totais, pertencendo ao Tipo I [4]. Isso ocorre devido ao fato de crianças possuírem a pele mais fina que a dos adultos, o estrato córneo mais reduzido e terem menor quantidade de pelos, exibindo, assim, maior sensibilidade a agentes químicos, físicos e microbiológicos [27]. Os xampus infantis, os quais são formulações aquosas que tem a finalidade de remover a sujeira e o excesso de oleosidade do couro cabeludo e dos cabelos, possuem na composição diferentes tipos de tensoativos, tais como o lauril éter sulfo-succinato de sódio e o coco II imidazolina ([28]; [29]). Na limpeza promovida pelos xampus há a abertura das cutículas das fibras capilares, as quais são seladas pelos condicionadores, que são emulsões de óleo em água estabilizadas por tensoativos catiônicos [27].
Rosa et al. [30] realizou a análise de amostras de 10 xampus e 10 cremes condicionadores para higiene infantil, com e sem a inativação do sistema conservante, sendo encontrado crescimento de microrganismos não patogênicos em 50% dos xampus e 30% dos cremes condicionadores capilares acima dos limites máximos aceitáveis. Nas amostras de ambas as formulações foi observada a predominância de Staphylococcus coagulase-negativa e Bacillus sp. Além de espécies bacterianas, também foram isolados fungos dos gêneros Cladosporium sp, Penicillium sp, Rhodococcus sp e Acremonium sp., os quais são conhecidos por serem contaminantes ambientais e que, em condições favoráveis, como em pele não íntegra, comprometimento do sistema imunológico do indivíduo ou elevada carga microbiana, podem causar doenças. Em todas as amostras contaminadas de xampus e de condicionadores em que não houve a inativação do sistema conservante foi sugerida a ocorrência de biocarga acima dos limites aceitáveis e/ou falha do sistema conservante, os quais podem reduzir a vida útil do produto e torná-lo impróprio para uso, mesmo que dentro do prazo de validade rotulado. Conforme apresentado anteriormente, a função do conservante não é compensar desvios das boas práticas de fabricação, embora muitos fabricantes o façam na tentativa de manter a carga microbiana dentro dos limites especificados, desconsiderando a toxicidade decorrente dessa prática.
A qualidade microbiológica de 18 formulações de xampus manipulados, com e sem a adição de sistema conservante, também foi avaliada por [31]. Nos testes microbiológicos executados com 0, 30 e 60 dias verificou-se redução do pH das amostras de xampus e aumento da população microbiana no final de 2 meses, demonstrando a correlação entre esses parâmetros. No trabalho foi observado o crescimento de Staphylococcus aureus, Salmonella sp, Pseudomonas aeruginosa e Escherichia coli. O conservante empregado não se mostrou efetivo, pois as formulações de xampu com e sem conservantes apresentaram alterações no pH, densidade, viscosidade e contaminação microbiológica, não sendo apropriadas para uso.
Almukainzi et al. [32] investigou a qualidade e a segurança de preparações cosméticas tópicas comumente utilizadas, como creme, xampu, tintura e sérum capilar. Neste estudo 14 amostras apresentaram contaminação microbiana, havendo predomínio de Staphylococcus aureus, seguido por Bacillus sp. O Staphylococcus aureus é um microrganismo normal da pele, mas que também pode atuar como um patógeno oportunista, causando infecções de pele e tecidos moles, as quais são caracterizadas pela presença de eczema, acne e erupção cutânea eritematosa. O gênero Bacillus sp faz parte da microbiota transitória da pele e, dentro desse gênero, a subdivisão Bacillus cereus é reconhecida por poder causar infecções graves na forma de abscessos, bacteremia/septicemia, infecções de feridas e queimaduras, infecções de ouvido, oftalmite, osteomielite, peritonite e infecções do trato respiratório e urinário. Staphylococcus aureus e Bacillus spp. também foram identificados por [33] em preparações capilares, além do patógeno Pseudomonas aeruginosa.
Alshehrei [34] avaliou a qualidade microbiológica de 32 cosméticos para cuidados da pele e do corpo comercializados na região de Meca, na Arábia Saudita, dos quais 26 cosméticos apresentaram contagem acima dos limites especificados pelo FDA (Food and Drug Administration). O creme condicionador foi a formulação com maior percentual de contaminação, exibindo contagem de 48 x 105 UFC/g e a presença de Staphylococcus spp., Bacillus spp., Aspergillus spp. e Penicillium spp.
Shaqra e Al Groom [11] avaliaram quanto a qualidade microbiológica 57 marcas de cosméticos para cabelos e cuidados com a pele comercializados na Jordânia. A maioria dos isolados bacterianos em preparações capilares foram Pseudomonas spp., Staphylococcus aureus, Staphylococcus coagulase-negativa e enterobactérias. Das 22 formulações capilares analisadas, 7 apresentaram falhas no teste de eficácia do sistema conservante, ou seja, em 31,8% dos produtos comercializados os conservantes selecionados não foram efetivos em inibir o crescimento microbiano durante o tempo de vida útil da formulação ou mesmo houve problemas de compatibilidade deles com os outros constituintes da formulação. Em condicionadores e emulsões reparadoras foram detectadas espécies de Candida sp, em cujas formulações foram adicionados compostos quaternários de amônio como conservantes, os quais necessitam que a formulação tenha pH ácido para um melhor desempenho, sugerindo que este ambiente foi capaz de oferecer condições adequadas para o crescimento das leveduras.
Em relação ao trabalho publicado por Shaqra e Al Groom [11] foi constatado, ainda, isolamento de Pseudomonas aeruginosa em todos os produtos avaliados, com exceção dos condicionadores capilares. A enterobactéria Escherichia coli, um indicador de contaminação fecal, foi isolada de uma preparação de xampu. Os autores verificaram também que espécies bacterianas Gram-positivas de Microcococcus e estafilococos coagulase-negativos foram recuperadas apenas de produtos fortemente contaminados, ratificando dados da literatura que demonstram que bactérias Gram-negativas possuem crescimento mais pronunciado em formulações cosméticas que bactérias Gram-positivas.
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3.5. Estratégias para controle da contaminação microbiana
Índices de contaminação reduzidos, dentro de padrões especificados são necessários para obtenção de um produto cosmético com garantia da qualidade microbiológica, bem como a manutenção de controles eficazes desde a seleção das matérias-primas até o refino do produto final [1]. Dessa forma, antes de serem disponibilizados para comercialização, os cosméticos capilares devem ser submetidos à diferentes testes a fim de avaliar o cumprimento dos requisitos normativos dos órgãos de vigilância sanitária no que se refere à qualidade e à estabilidade microbiológica, visando a prevenção da proliferação de bactérias e fungos nos produtos [35].
Os níveis de contaminação microbiana nas matérias-primas, materiais de embalagem e no produto final devem ser controlados considerando que estes são produtos não estéreis para aplicação tópica no cabelo e no couro cabeludo. A adoção de BPF pelas indústrias cosméticas é essencial para a garantia da qualidade, segurança e eficácia dos produtos, cujos requisitos mínimos encontram-se descritos na Resolução de Diretoria Colegiada Nº 48, de 25 de outubro de 2013 (RDC 48/13), da Anvisa, a qual aprova o Regulamento Técnico de Boas Práticas de Fabricação para Produtos de Higiene Pessoal, Cosméticos e Perfumes. Os requisitos mínimos envolvem especificações relativas às instalações físicas; à manutenção da qualidade do ar e da água; validação dos processos produtivos, da qualidade da água e do ar, bem como dos procedimentos de limpeza das áreas fabris e equipamentos; à introdução dos estudos de validação de processos, sistemas e métodos analíticos; ao controle de qualidade das matérias-primas, dos materiais de embalagem primária e produtos acabados; e controle de registros e documentações geradas durante toda a cadeia de produção do lote industrial [18].
Conforme Resolução do Conselho Federal de Farmácia (CFF) Nº 406, de 15 de dezembro de 2022, que regulamenta as atividades do farmacêutico na indústria cosmética, respeitadas as atividades afins com outras profissões, ao avaliar os desvios de qualidade com o sistema de Garantia da Qualidade é possível promover ações de investigação das causas e adotar medidas necessárias para sua correção [36]. Análise crítica dos riscos envolvidos em cada uma das etapas produtivas deve ser realizada visando identificar aquelas que oferecem maior probabilidade de contaminação microbiológica e medidas que devem ser implementadas para evitar danos ao produto e ao usuário [15].
A qualidade microbiológica dos produtos cosméticos é um dos elementos fundamentais para sua adequada performance, sobretudo no que diz respeito à segurança, eficácia e aceitabilidade. Se faz essencial o controle de qualidade na detecção e avaliação de pontos críticos de contaminação, a fim de se obterem produtos de excelente qualidade, estabilidade e confiança [31].
4. Considerações finais
A qualidade, a segurança e a aceitação dos produtos cosméticos capilares no mercado possuem como requisito essencial para seu bom desempenho o padrão microbiológico. Neste sentido, os dados apresentados nesse trabalho contribuem significativamente para a compreensão do cenário de contaminações microbiológicas em cosméticos capilares, bem como a compreensão da microbiota presente. As bactérias Gram-negativas mostraram-se os microrganismos de maior relevância no que diz respeito à segurança dos produtos, tendo a Pseudomonas aeruginosa o maior número de ocorrências. Pela revisão integrativa realizada é possível verificar que muitos produtos para os cuidados dos cabelos possuem qualidade inadequada, demonstrando a ocorrência de falhas nas etapas produção, controle de qualidade ou mesmo no desenvolvimento da formulação.
Medidas que garantam reduzida carga microbiana não patogênica no produto, satisfaçam os limites especificados pelos órgãos de vigilância sanitária, bem como evitem a contaminação por microrganismos patogênicos, devem ser avaliadas e implementadas pelos fabricantes de modo a entregar produtos com a devida qualidade e que resguardem a saúde e bem-estar do usuário. Neste sentido, a adoção de BPF em todo o ciclo de produção do cosmético deve ser prioridade, o mesmo se aplica à seleção do sistema conservante apropriado às características do produto e aos microrganismos passíveis de crescimento. Ademais, tendo em vista que o controle de qualidade microbiológico se estende da qualificação dos fornecedores das matérias-primas até a liberação do produto final, esta também é uma etapa essencial e deve ter o enfoque apropriado para garantir a disponibilidade de produtos seguros e de qualidade ao consumidor, bem como evitar prejuízos econômicos e o comprometimento da visibilidade das empresas.
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5. Declaração de direitos
O(s)/A(s) autor(s)/autora(s) declara(m) ser detentores dos direitos autorais da presente obra, que o artigo não foi publicado anteriormente e que não está sendo considerado por outra(o) Revista/Journal. Declara(m) que as imagens e textos publicados são de responsabilidade do(s) autor(s), e não possuem direitos autorais reservados à terceiros. Textos e/ou imagens de terceiros são devidamente citados ou devidamente autorizados com concessão de direitos para publicação quando necessário. Declara(m) respeitar os direitos de terceiros e de Instituições públicas e privadas. Declara(m) não cometer plágio ou auto plágio e não ter considerado/gerado conteúdos falsos e que a obra é original e de responsabilidade dos autores.
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Universidade Federal Fluminense
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