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ISSN: 2595-8402

Journal DOI: 10.61411/rsc31879

REVISTA SOCIEDADE CIENTÍFICA, VOLUME 7, NÚMERO 1, ANO 2024
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ARTIGO ORIGINAL

O filme “Eu, Tu, Eles” e os relacionamentos não monogâmicos: entendimento dos Poderes Legislativo e Judiciário

Douglas Marques1

 

Como Citar:

MARQUES, Douglas. O filme “Eu, Tu, Eles” e os relacionamentos não monogâmicos: entendimento dos Poderes Legislativo e Judiciário. Revista Sociedade Científica, vol.7, n. 1, p.3588-3611, 2024.

https://doi.org/10.61411/rsc202469317

 

DOI: 10.61411/rsc202469317

 

Área do conhecimento: Direito.

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Palavras-chaves: filme “Eu, Tu, Eles”; relações não monogâmicas; tutela estatal.

 

Publicado: 19 de agosto de 2024.

Resumo

Os relacionamentos não monogâmicos, apesar de existirem na vida cotidiana dos brasileiros, conforme retratado no filme “Eu, Tu, Eles” e corroborado por diversas notícias jornalísticas, não são tutelados pelo Estado, tanto pelo Poder Legislativo quanto pelo Poder Judiciário. Confirmar esta afirmação foi o objetivo geral deste artigo. Para isto, em um primeiro momento foi mostrado de maneira breve como a sociedade se comporta neste assunto de acordo com matérias jornalísticas, bem como, a maneira como o Legislativo trata a situação. Em seguida, houve a descrição do filme “Eu, Tu, Eles” e, por fim, foi relatada a maneira como o Judiciário e a doutrina civilista enxergam o tópico. Quanto à metodologia, a pesquisa será básica, exploratória e descritiva, qualitativa, com método de abordagem dedutivo por meio da técnica de pesquisa bibliográfica, com o método de abordagem indutivo por meio da técnica documental em relação ao filme analisado e com o método hipotético-dedutivo. Por fim, o objetivo foi alcançado e a hipótese confirmada.

 

 

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The movie "Me, You, Them" and non-monogamous relationships: understanding of the Legislative and Judiciary powers

Abstract

Non-monogamous relationships, despite existing in the everyday lives of Brazilians, as depicted in the movie "Me, You, Them" and supported by various news reports, are not regulated by the State, neither by the Legislative nor the Judiciary powers. Confirming this statement was the overall objective of this article. To achieve this, the first step was to briefly show how society behaves on this issue according to news articles, as well as how the Legislative branch addresses the situation. Next, there was a description of the movie "Me, You, Them," followed by an account of how the Judiciary and civil doctrine view the topic. Regarding methodology, the research will be basic, exploratory, and descriptive, qualitative, with a deductive approach through the bibliographic research technique, an inductive approach through the documentary technique concerning the analyzed film and a hypothetical deductive approach. Finally, the objective was achieved and the hypothesis was confirmed.

Keywords: movie “Me, You, Them”; non-monogamous relationships; state guardianship.

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1.Introdução

Hodiernamente, relacionamentos não monogâmicos já são uma realidade na vida cotidiana do brasileiro [1] [2] [3] [4], entretanto, no Brasil é proibido múltiplas relações matrimonializadas e conforme regramento do Estado, quem não se adequa a este modelo de relação, acaba sendo tolhido de sua liberdade de escolha. Neste sentido, a monogamia é considerada uma forma de manter as famílias ordenadas, com raízes meramente morais [5]. Neste sentido, há diversas normas que mostram que o ordenamento pátrio não aceita outro tipo de relação, como por exemplo, o crime de bigamia [6], o fato de pessoas casadas não poderem casar [7], a nulidade de eventual segundo casamento [8], a anulabilidade de doação feita pelo adúltero a seu cúmplice [9], a reivindicação de bens comuns transferidos pelo cônjuge ao concubino [10] e nomear estas relações múltiplas de concubinato [11].

Ainda, conforme entendimento do Conselho Nacional de Justiça [12], os cartórios são proibidos de fazer escrituras públicas de relações poliafetivas. Assim, pode-se afirmar que, as pessoas que querem formar relações diferentes do modelo monogâmico ainda são marginalizadas, no sentido de proteção Estatal, além de impedidas de exercerem plenamente suas autonomias privadas.

Ato contínuo, a vida em sociedade evolui mais rapidamente do que as ciências jurídicas, pois nesta parte da ciência, uma posição vanguardista depende, principalmente, do pensamento daqueles que compõe o Poder Legislativo para que haja maior atualização entre as normas e a vida cotidiana moderna brasileira. Em sentido oposto, as ciências artísticas gozam de maior liberdade e, por vezes, retratam as vivências sociais contemporâneas quase que de forma concomitante.

Deste modo, como forma de retratar o objeto deste artigo, o filme, “Eu, Tu, Eles” [13], mostra como é possível as relações não monogâmicas darem certo e como seria justo existir uma proteção legal para quem decide viver desta forma.

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2.Metodologia

Para alcançar tal intento, quanto à finalidade, será feita uma pesquisa básica, voltada à aquisição de conhecimentos. Quanto à abordagem, a pesquisa será qualitativa, pois o autor interpretará a mensagem do filme, bem como, as normas pátrias e matérias jornalísticas. Já em relação aos métodos empregados, serão utilizadas a pesquisa documental e bibliográfica. Quanto aos objetivos, será uma pesquisa exploratória, em razão da busca das normas brasileiras e de matérias jornalísticas e descritiva, por tentar descrever as características do filme e do comportamento brasileiro moderno. Em relação ao método de procedimento e aos métodos de abordagem, a pesquisa será dedutiva por meio da técnica de pesquisa bibliográfica, indutiva por meio da técnica documental (filme) e hipotética-dedutiva, em virtude da confirmação ou não da hipótese inicial [14] [15] [16].

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3.Filme “Eu, Tu, Eles”

O referido filme foi inspirado nas crônicas reais de Maria Marlene Silva Sabóia, que viveu por dezessete anos com três maridos no interior do estado do Ceará, desde a década de 1960 [17].

A película [13] conta a história de Darlene (Regina Casé), grávida e solteira, que vai embora da sua região habitual e vai trabalhar nos canaviais do nordeste brasileiro com Dimas, seu filho. Posteriormente, nesta localidade, ela conhece Osias (Lima Duarte), um homem mais velho e orgulhoso de sua casa ter sido construída por ele próprio. Assim que Osias conhece Darlene, se interessa romanticamente por ela e lhe propõe o casamento, sendo aceito por ela, cujo interesse ia além das questões afetivas, pois, dentro daquela realidade, Osias podia ser considerado um homem abastado, o que garantiria certo conforto à sofrida mulher.

Logo depois de contraírem o matrimônio, Osias resolve se aposentar, enquanto Darlene continuava a trabalhar arduamente, tanto nos canaviais, quanto nos serviços domésticos. Nesta continuação, importante frisar que Darlene era uma mulher empoderada, que não limitava suas vontades e, assim, mesmo casada, se relacionou sexualmente com um prestador de serviços que visitou sua casa e, deste caso, engravidou e teve um filho desse homem.

Após o nascimento da criança, Osias obviamente percebeu que o filho não era biologicamente dele em razão de suas características físicas, contudo, fingiu normalidade e não houve alteração na rotina da família, tratando as duas crianças, que não eram biologicamente dele, como se fossem. Em seguida, Zezinho (Stênio Garcia), primo de Osias, da mesma faixa etária, solteiro, bom cozinheiro, gentil, exímio ajudante dos afazeres do lar, passou a morar junto com Darlene, Osias e as duas crianças.

Assim, Zezinho começou a ajudar Darlene nas tarefas domésticas, inclusive fazendo o almoço diário dela, levando gentilmente até o canavial onde trabalhava. Deste modo, com tamanha gentileza, Zezinho foi se aproximando romanticamente de Darlene, que, ao perceber que Zezinho nunca se casou e como maneira de agradecer por tanto zelo, teve relações sexuais com ele, fato que também gerou uma gravidez.

Seguidamente, após o nascimento do terceiro filho e adaptada à rotina romântica que tinha com o marido Osias e com seu primo Zezinho, Darlene conheceu Ciro (Luiz Carlos Vasconcelos) em seu trabalho, homem bonito, mais novo e cheio de vitalidade. Diante disso, Ciro foi convidado por Darlene para jantar em sua casa e nesta ocasião, Osias gostou do rapaz e o convidou para dormir em sua casa, sofrendo certa resistência de Zezinho, que estava enciumado com a presença do homem na casa.

Ulteriormente, Darlene se relaciona sexualmente com Ciro e desta relação nasce mais uma criança. Neste momento, Darlene está apaixonada por Ciro e com medo de perdê-la, Osias e Zezinho constroem um cômodo para Ciro morar com eles em definitivo. Por fim, Osias, que não é pai biológico de nenhum dos quatro filhos de Darlene, registra todos os filhos de Darlene em seu nome, declarando-se pai biológico de todos e assim termina esta história, com Darlene morando com três companheiros, sendo um oficialmente marido (Osias), com três dos quatros filhos (o primeiro ela levou para morar com o pai biológico, que apareceu brevemente no filme). Assim, neste lar, todos homens agiam como pais socioafetivos de todas as crianças ao mesmo tempo, mas como já dito, Osias registrou todos em seu nome, mesmo não sendo o pai biológico das crianças.

Este filme, além de premiado internacionalmente [18] [19], mostra a história de vida de uma mulher, que tinha três maridos e filhos morando em um mesmo lar, de forma pacífica e organizada. Desta forma, o filme retrata que há sim arranjos matrimoniais não monogâmicos [20], que precisam também da tutela estatal, de modo que os direitos da personalidade e patrimoniais destas pessoas sejam protegidos.

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4.Casamento e monogamia

Os documentos históricos jurídicos mais antigos que versam sobre o casamento datam aproximadamente do ano 3000 antes da era comum. Neste sentido, para o Direito romano, canônico, as famílias eram baseadas na monogamia. Em sentido oposto, o Direito muçulmano admite a poligamia, podendo o homem ter quatro mulheres legítimas, além das concubinas, se não se comprometeu a ficar apenas monógamo [21].

Assim, percebe-se a ideia de monogamia tem sua base nos preceitos religiosos ou morais e não na autonomia livre de amar conforme a vontade privada. Atualmente, claramente, há modelos mais complexos de convivência, tanto conjugal quanto familiar.

Desse modo, a família convencional, constituída por um homem e uma mulher, unidos pelos sagrados laços do matrimônio, até que a morte os separe, com o dever de gerar filhos, não é mais o modelo absoluto atualmente [22].

Sendo assim, é obviamente possível amar duas ou mais pessoas ao mesmo tempo de forma afetiva e sexual, ou seja, não adianta determinação legal impondo o dever de fidelidade no casamento, ou dever de lealdade na união estável, pois, a vontade humana não consegue ser limitada, entretanto, apesar da fidelidade ser tutelada pelo ordenamento brasileiro, é difícil aplicá-la nas relações não monogâmicas [23].

Neste sentido, a expressão pejorativa “concubinato” é empregada para identificar os amores mantidos fora do casamento tradicional e, por isto, se houver mais de duas pessoas se relacionando, ainda que de maneira séria, a tutela jurídica do casamento ou união estável tradicionais não são aplicadas a estes.

Portanto, ainda que haja proibição do ordenamento pátrio e do CNJ para que tabeliães lavrem escrituras públicas de uniões não monogâmicas, não há como fingir que tais relacionamentos não existem no mundo dos fatos, podendo ou não gerar efeitos jurídicos, a depender das circunstâncias do caso concreto [24]. Em que pese o entendimento majoritário, ainda há aqueles tabeliães que entendem o assunto de modo diverso e reconhecem via escritura pública a união entre três ou mais pessoas [25] mesmo com a grande possibilidade de terem seus atos invalidados.

Nesta perspectiva, também é possível encontrar um posicionamento de juízes que se posicionam de forma diversa da maioria, conforme a seguir:

A coexistência de duas ou mais relações afetivas paralelas, nas quais as pessoas se aceitem mutuamente, motiva a partilha dos bens em três partes iguais, segundo decisão inédita dada por um juiz de Rondônia.

Em uma Ação Declaratória de União Estável, o juiz Adolfo Naujorks, da 4ª Vara de Família da Comarca de Porto Velho, determinou a divisão dos bens de um homem entre ele, a esposa com quem era legalmente casado, e a companheira, com quem teve filhos e conviveu durante quase trinta anos [26].

 

APELAÇÃO. UNIÃO DÚPLICE. UNIÃO ESTÁVEL. POSSIBILIDADE. A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união entre a autora e o de cujus em período concomitante ao casamento de "papel". Reconhecimento de união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a esposa, a companheira e o de cujus. Meação que se transmuda em "triação", pela duplicidade de uniões. DERAM PROVIMENTO, POR MAIORIA, VENCIDO O DES. RELATOR. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível, Nº 70019387455, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ari Azambuja Ramos, Redator: Rui Portanova, Julgado em: 24-05-2007). Assunto: 1. UNIÃO ESTÁVEL DÚBLICE OU PARALELA. REQUISITOS. PROVA DOCUMENTAL. PROVA TESTEMUNHAL. VALOR. VALORIZAÇÃO. DISSOLUÇÃO POR MORTE. PARTILHA DE BENS. CRITÉRIO. MEAÇÃO OU TRIAÇÃO. DIVISÃO EM TRÊS PARTES. DIVISÃO ENTRE ESPOSA, COMPANHEIRA E DE CUJUS. DIVISÃO ENTRE ESPOSA, COMPANHEIRA E SUCESSÃO. 2. COMPANHEIRO CASADO. 3. TEORIA DO PORTANOVA. RUI PORTANOVA. Jurisprudência: APC 70011962503 [27].

 

APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL PARALELA AO CASAMENTO E OUTRA UNIÃO ESTÁVEL. UNIÃO DÚPLICE. POSSIBILIDADE. PARTILHA DE BENS. MEAÇÃO. "TRIAÇÃO ". ALIMENTOS. A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união estável entre a autora e o réu em período concomitante ao seu casamento e, posteriormente, concomitante a uma segunda união estável que se iniciou após o término do casamento. Caso em que se reconhece a união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a esposa, a companheira e o réu. Meação que se transmuda em "triação", pela duplicidade de uniões. O mesmo se verificando em relação aos bens adquiridos na constância da segunda união estável. Eventual período em que o réu tiver se relacionado somente com a apelante, o patrimônio adquirido nesse período será partilhado à metade. Assentado o vínculo familiar e comprovado nos autos que durante a união o varão sustentava a apelante, resta demonstrado os pressupostos da obrigação alimentar, quais sejam, as necessidades de quem postula o pensionamento e as possibilidades de quem o supre. Caso em que se determina o pagamento de alimentos em favor da ex-companheira. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível, Nº 70022775605, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em: 07-08-2008). Assunto: 1. DIVISÃO EM TRÊS PARTES. TRIAÇÃO. 2. UNIÃO ESTÁVEL DÚPLICE OU PARALELA. RECONHECIMENTO. REQUISITOS. TERMO INICIAL. PROVA. DISSOLUÇÃO. PARTILHA DE BENS. CRITÉRIO. MEAÇÃO OU TRIAÇÃO. DIVISÃO ENTRE ESPOSA, COMPANHEIRA E COMPANHEIRO. 3. ALIMENTOS. EX-COMPANHEIRA. COMPANHEIRA. CRITÉRIO PARA SUA FIXAÇÃO. FIXAÇÃO. CABIMENTO. 4. PARTILHA DE BENS. FORMA. MEAÇÃO. TRIAÇÃO. 5. MARCOS TEMPORAIS DA UNIÃO ESTÁVEL E CASAMENTO. 6. COMPANHEIRO CASADO. 7. SUCUMBÊNCIA PARCIAL. CUSTAS E HONORÁRIOS DE ADVOGADO. RESPONSABILIDADE. 8. TEORIA DO PORTANOVA. RUI PORTANOVA. . Referência legislativa: CC-1723 PAR-1 DE 2002 NCC-1723 PAR-1 CC-1658 DE 2002 NCC-1658 CC-1725 DE 2002 NCC-1725 CC-1694 DE 2002 NCC-1694 . Jurisprudência: APC 70017045733 APC 70012696068 APC 70011258605 APC 70010787398 APC 70006046122 APC 70006936900 APC 70019387455 APC 70011258605 [28].

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Além disto, parte relevante da doutrina brasileira, ainda que possua entendimento minoritário, compactua com este entendimento, como por exemplo, Rolf Madaleno, Caio Mario da Silva Pereira, Maria Berenice Dias e Guilherme de Oliveira [29].

Todavia, ainda prevalece no Superior Tribunal de Justiça o entendimento da impossibilidade de concubinato concomitante ao casamento, a seguir:

Direito civil. Família. Recurso especial. Ação de reconhecimento de união estável. Casamento e concubinato simultâneos. Improcedência do pedido.

- A união estável pressupõe a ausência de impedimentos para o casamento, ou, pelo menos, que esteja o companheiro(a) separado de fato, enquanto que a figura do concubinato repousa sobre pessoas impedidas de casar. - Se os elementos probatórios atestam a simultaneidade das relações conjugal e de concubinato, impõe-se a prevalência dos interesses da mulher casada, cujo matrimônio não foi dissolvido, aos alegados direitos subjetivos pretendidos pela concubina, pois não há, sob o prisma do Direito de Família, prerrogativa desta à partilha dos bens deixados pelo concubino. - Não há, portanto, como ser conferido status de união estável a relação concubinária concomitante a casamento válido. Recurso especial provido [30].

 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PEDIDO DE ARROLAMENTO E PARTILHA DE BENS. UNIÃO ESTÁVEL CONCOMITANTE A CASAMENTO SEM SEPARAÇÃO DE FATO. 1. À luz do disposto no § 1º do artigo 1.723 do Código Civil de 2002, a pedra de toque para o aperfeiçoamento da união estável não está na inexistência de vínculo matrimonial, mas, a toda evidência, na inexistência de relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica. Nesse viés, apesar de a dicção da referida norma também fazer referência à separação judicial, é a separação de fato (que, normalmente, precede a separação de direito e continua após tal ato formal) que viabiliza a caracterização da união estável de pessoa casada. 2. Consequentemente, mantida a vida em comum entre os cônjuges (ou seja, inexistindo separação de fato), não se poderá reconhecer a união estável de pessoa casada. Nesse contexto normativo, a jurisprudência do STJ não admite o reconhecimento de uniões estáveis paralelas ou de união estável concomitante a casamento em que não configurada separação de fato. 3. No caso dos autos, procedendo-se à revaloração do quadro fático delineado no acórdão estadual, verifica-se que: (a) a autora e o réu (de cujus) mantiveram relacionamento amoroso por 17 anos; (b) o demandado era casado quando iniciou tal convívio, não tendo se separado de fato de sua esposa; e (c) a falta de ciência da autora sobre a preexistência do casamento (e a manutenção da convivência conjugal) não foi devidamente demonstrada na espécie, havendo indícios robustos em sentido contrário. 4. Desse modo, não se revela possível reconhecer a união estável alegada pela autora, uma vez que não foi atendido o requisito objetivo para sua configuração, consistente na inexistência de relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica. 5. Uma vez não demonstrada a boa-fé da concubina de forma irrefutável, não se revela cabida (nem oportuna) a discussão sobre a aplicação analógica da norma do casamento putativo à espécie. 6. Recursos especiais do espólio e da viúva providos para julgar improcedente a pretensão deduzida pela autora [31].

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Além dos exemplos sobreditos, o STJ reiterou tal entendimento na afirmação n. 4, publicada na Edição n. 50 da ferramenta “Jurisprudência em Teses” sobre união estável: “não é possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas” [32]. Da mesma forma, prevalece no Supremo Tribunal Federal o mesmo entendimento:

EMENTA Direito Previdenciário e Constitucional. Recurso extraordinário. Sistemática da repercussão geral. Tema nº 526. Pensão por morte. Rateio entre a concubina e a viúva. Convivência simultânea. Concubinato e Casamento. Impossibilidade. Recurso extraordinário provido. 1. Assentou-se no acórdão recorrido que, comprovada a convivência e a dependência econômica, faz jus a concubina à quota parte de pensão deixada por ex-combatente, em concorrência com a viúva, a contar do pedido efetivado na seara administrativa. Tal orientação, contudo, contraria a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do processo paradigma do Tema nº 529 sob a sistemática da repercussão geral, in verbis: “A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro”. 2. Antes do advento da Constituição de 1988, havia o emprego indistinto da expressão concubinato para qualquer relação não estabelecida sob as formalidades da lei, daí porque se falava em concubinato puro (hoje união estável) e concubinato impuro (relações duradoras com impedimento ao casamento). Erigida a união estável, pelo texto constitucional (art. 226, § 3º, da CF), ao status de entidade familiar e tendo o Código Civil traçado sua distinção em face do concubinato (art. 1.723, § 1º, c/c art. 1.521, VI e art. 1.727 do CC), os termos passaram a disciplinar situações diversas, o que não pode ser desconsiderado pelo intérprete da Constituição. 3. O art. 1.521 do Código Civil – que trata dos impedimentos para casar -, por força da legislação (art. 1.723, § 1º), também se aplica à união estável, sob claro reconhecimento de que a ela, como entidade familiar, também se assegura proteção à unicidade do vínculo. A espécie de vínculo que se interpõe a outro juridicamente estabelecido (seja casamento ou união estável) a legislação nomina concubinato (art. 1.727 do CC). Assim, a pessoa casada não pode ter reconhecida uma união estável concomitante, por força do art. 1.723, § 1º, c/c o art. 1.521, VI, do Código Civil. 4. Considerando que não é possível reconhecer, nos termos da lei civil (art. 1.723, § 1º, c/c art. 1.521, VI e art. 1.727 do Código Civil Brasileiro), a concomitância de casamento e união estável (salvo na hipótese do § 1º, art. 1.723, do CC/02), impende concluir que o concubinato – união entre pessoas impedidas de casar - não gera efeitos previdenciários. 5. A exegese constitucional mais consentânea ao telos implícito no microssistema jurídico que rege a família, entendida como base da sociedade (art. 226, caput, da CF), orienta-se pelos princípios da exclusividade e da boa-fé, bem como pelos deveres de lealdade e fidelidade que visam a assegurar maior estabilidade e segurança às relações familiares. 5. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “É incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável”. 6. Recurso extraordinário a que se dá provimento [33].

 

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. EX-SERVIDOR DA FUNAI. PENSÃO CIVIL VITALÍCIA. PAGAMENTO PARA CÔNJUGE E COMPANHEIRA. NEGATIVA DE REGISTRO. DETERMINAÇÃO DE REFAZIMENTO DO ATO. UNIÃO ESTÁVEL E CONCUBINATO: INSTITUTOS DISTINTOS. PRECEDENTE. INDEFINIÇÃO SOBRE A SITUAÇÃO DA IMPETRANTE. LEGALIDADE DO ATO IMPUGNADO. MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO. 1. O reconhecimento da ausência de base legal para o rateio da pensão entre viúva e alegada companheira está fundado na impossibilidade jurídica de concomitância dessas duas situações, conforme expresso no julgamento do Recurso Extraordinário n. 397.762/BA (Relator o Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma), quando assentada a distinção entre os institutos da união estável e do concubinato, sendo não acolhido no sistema previdenciário brasileiro. 2. O ato do Tribunal de Contas da União, fundado no inc. III do art. 71 da Constituição da República, é inconclusivo sobre a situação da Impetrante e dos demais interessados, não se havendo cogitar de lesão a direito subjetivo decorrente de relação fático-jurídica incontroversa. 3. Mandado de segurança denegado, cassando-se a liminar antes deferida e julgando-se prejudicado o agravo regimental interposto [34].

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Em relação à parte doutrinária que compactua com este entendimento, encontram-se Maria Helena Diniz e Álvaro Villaça Azevedo. Além destes, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Luiz Fux e Nunes Marques também compactuam com esta convicção [35]. Também neste sentido, José Fernando Simão [36].

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5.Considerações finais

O objetivo deste pequeno texto foi mostrar que, apesar de existirem relações não monogâmicas na sociedade brasileira, muito bem retratadas no filme “Eu, Tu, Eles” [13], o direito brasileiro ainda entende, majoritariamente, que não é possível reconhecer direitos àqueles que optam por estas relações.

O termo "relacionamento poliafetivo" refere-se ao estabelecimento de um relacionamento íntimo simultâneo com mais de uma pessoa ao mesmo tempo, com o consentimento e conhecimento de todas as partes envolvidas. O poliamor está ganhando popularidade, embora a maioria da sociedade ainda não o aceite. “Eu Tu Eles” [13], dirigido por Andrucha Waddington, conta a história de uma mulher poliafetiva que vive com três homens. O filme aborda temas como amor, liberdade, ciúme, preconceito e mostra como o cinema pode ser uma ferramenta para a discussão de questões sociais e culturais. É importante reconhecer juridicamente que as pessoas podem viver suas vidas amorosas de acordo com suas próprias escolhas, mesmo que os relacionamentos não monogâmicos ainda não sejam reconhecidos no direito brasileiro.

Por certo, em algum momento o direito pátrio terá que regular esta situação que permeia parte da sociedade. Assim, conforme aludido sensivelmente por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka [37], “que o direito não permaneça alheio à realidade humana [...]. Cerrar os olhos, talvez seja mais um dos inúmeros momentos de hipocrisia que o Legislativo e o Judiciário têm repetido deixar acontecer [...]”.

Entretanto, até que este momento chegue, é importante que os profissionais do Direito Civil abordem o tema com maturidade, sensatez, sem discriminação e, acima de tudo, em consonância com o princípio fundamental da dignidade humana nas relações afetivas [38].

Neste mesmo sentido, Flávio Tartuce [39] acredita que em breve serão admitidos relacionamentos polígamos, que o futuro é das famílias paralelas, especialmente pela visão de mundo das gerações mais novas.

Para chegar a esta conclusão, o autor assume como verdadeira a afirmação de que não há proteção estatal para relacionamentos não monogâmicos e, com isto, foi possível validar a hipótese de que pessoas que são polígamas, que respeitam suas vontades e que vivem relacionamentos distantes da moral imposta, não são resguardadas corretamente pelo Estado.

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6.Declaração de direitos

O(s)/A(s) autor(s)/autora(s) declara(m) ser detentores dos direitos autorais da presente obra, que o artigo não foi publicado anteriormente e que não está sendo considerado por outra(o) Revista/Journal. Declara(m) que as imagens e textos publicados são de responsabilidade do(s) autor(s), e não possuem direitos autorais reservados à terceiros. Textos e/ou imagens de terceiros são devidamente citados ou devidamente autorizados com concessão de direitos para publicação quando necessário. Declara(m) respeitar os direitos de terceiros e de Instituições públicas e privadas. Declara(m) não cometer plágio ou auto plágio e não ter considerado/gerado conteúdos falsos e que a obra é original e de responsabilidade dos autores.

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7.Referências

  • ​​ BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Notícias. Reconhecimento da multiparentalidade oficializa novos arranjos familiares, 03 de março de 2019. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias-antigas/2019/2019-03-03_06-53_Reconhecimento-da-multiparentalidade-oficializa-novos-arranjos-familiares.aspx. Acesso em: 29 ago. 2023.

  • CASTRO, Carol; TOLEDO, Giuliana de. Poliamor: brasileiros apostam em diferentes formas de relacionamentos; Enquanto a ciência ainda tem poucas respostas para explicar a monogamia entre humanos, novas formas de se relacionar buscam espaço. Revista Galileu, Porto Alegre, 07 set. 2017. Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2017/09/poliamor-brasileiros-apostam-em-diferentes-formas-de-relacionamentos.html. Acesso em: 09 nov. 2023

  • POLIAMOR: dois casais se divorciam para iniciar relacionamento a quatro. Revista Crescer On-line, 13 de agosto de 2023. Disponível em: https://revistacrescer.globo.com/fique-por-dentro/noticia/2023/08/poliamor-dois-casais-se-divorciam-para-iniciar-relacionamento-a-quatro.ghtml. Acesso em: 29 ago. 2023.

  • POLO, Rafaela. ‘Apresentei a não monogamia ao meu marido’: tema é recorde de busca no Brasil. Universo Online, São Paulo, 16 maio 2023. Disponível em: https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2023/05/16/apresentei-nao-monogamia-ao-meu-marido-tema-e-recorde-de-busca-no-brasil.htm. Acesso em: 09 nov. 2023. 

  • DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 14. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2021. p. 60-61.

  • BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Brasília, DF: Presidência da República, 1940. Título VII, capítulo I, art. 235. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em 09 nov. 2023.

  • BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2002. Livro IV, título I, subtítulo I, capítulo, III, art. 1.521, VI. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 09 nov. 2023.

  • BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2002. Livro IV, título I, subtítulo I, capítulo, VIII, art. 1.548, II. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 09 nov. 2023.

  • BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2002. Título VI, seção II, subseção V, capítulo, III, art. 550. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 09 nov. 2023.

  • BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2002. Livro IV, Título I, Subtítulo I, capítulo, I, art. 1.642, incido V. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 09 nov. 2023.

  • BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2002. Título III, capítulo, VI, art. 1.727. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 09 nov. 2023.

  • CARTÓRIOS são proibidos de fazer escrituras públicas de relações poliafetivas. Conselho Nacional de Justiça, Brasília, 26 jun. 2018. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/cartorios-sao-proibidos-de-fazer-escrituras-publicas-de-relacoes-poliafetivas/. Acesso em: 09 nov. 2023.

  • EU, tu, eles. Direção: Andrucha Waddington. Intérpretes: Regina Casé, Lima Duarte, Stênio Garcia, Luiz Carlos Vasconcelos e outros. Roteiro: Elena Soàrez. Música: Gilberto Gil. São Paulo: Conspiração Filmes; Columbia Pictures, 2000, 1 DVD (104 min).

  • GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 7. ed. Barueri: Atlas, 2022. p. 40-44.

  • MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia científica. Atualização: João Bosco Medeiros. 8. ed. Barueri: Atlas, 2022. p. 54.

  • GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2024. p. 64.

  • BARTOLOMEI, Marcelo. “Faria tudo de novo”, diz Marlene, a mulher que inspirou o filme. Folha de São Paulo. São Paulo, 2000. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/cinema/entrevista_marlene.shtml. Acesso em: 28/08/2023.

  • FESTIVAL DE CANNES, 2000. Un Certain Regard Special Distinction Prize. Filme Eu, Tu, Eles. Disponível em: https://www.festival-cannes.com/en/f/eu-tu-eles/. Acesso em: 27 ago. 2023.

  • KARLOVY VARY INTERNATIONAL FILM FESTIVAL AWARD FOR GRAND PRIX – CRYSTAL GLOBE, 2000. History of the 35th festival. Filme Eu, Tu, Eles. ​​ Disponível em: https://www.kviff.com/en/history/2000. Acesso em: 27 ago. 2023.

  • GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume 6: direito de família. 13. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023. p. 44.

  • AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de direito civil: direito de família. 2ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. passim.

  • LENHARO, Mariana; DANTAS, Carolina. 50% dos homens brasileiros já traíram, diz estudo; mulheres traem menos; Salvador é a capital recordista em traição; já São Paulo é a mais fiel; Dados inéditos são de estudo que entrevistou 3 mil brasileiros. G1, São Paulo, 04 jul. 2016. Disponível em: https://g1.globo.com/bemestar/noticia/2016/07/50-dos-homens-brasileiros-ja-trairam-diz-estudo-mulheres-traem-menos.html. Acesso em: 09 nov. 2023.

  • GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume 6: direito de família. 13. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023. p. 167.

  • DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 14. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2021. p. 439-454.

  • CARTÓRIO reconhece união estável entre três pessoas. Conjur, São Paulo, 23 ago 2012. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2012-ago-23/cartorio-tupa-sp-reconhece-uniao-estavel-entre-tres-pessoas/. Acesso em: 10 nov. 2023.

  • DUPLA relação amorosa motiva partilha dos bens em três partes. Conjur, São Paulo, 17 nov. 2008. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2008-nov-17/juiz_reconhece_uniao_estavel_casamento_mesmo_tempo/. Acesso em: 10 nov. 2023.

  • RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70019387455. APELAÇÃO. UNIÃO DÚPLICE. UNIÃO ESTÁVEL. POSSIBILIDADE. A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união entre a autora e o de cujus em período concomitante ao casamento de "papel". Reconhecimento de união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a esposa, a companheira e o de cujus. Meação que se transmuda em "triação", pela duplicidade de uniões. DERAM PROVIMENTO, POR MAIORIA, VENCIDO O DES. RELATOR. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível, Nº 70019387455, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ari Azambuja Ramos, Redator: Rui Portanova, Julgado em: 24-05-2007). Assunto: 1. UNIÃO ESTÁVEL DÚBLICE OU PARALELA. REQUISITOS. PROVA DOCUMENTAL. PROVA TESTEMUNHAL. VALOR. VALORIZAÇÃO. DISSOLUÇÃO POR MORTE. PARTILHA DE BENS. CRITÉRIO. MEAÇÃO OU TRIAÇÃO. DIVISÃO EM TRÊS PARTES. DIVISÃO ENTRE ESPOSA, COMPANHEIRA E DE CUJUS. DIVISÃO ENTRE ESPOSA, COMPANHEIRA E SUCESSÃO. 2. COMPANHEIRO CASADO. 3. TEORIA DO PORTANOVA. RUI PORTANOVA. Jurisprudência: APC 70011962503. Apelante: M.G.V.B. Apelado: A.A.S.D.B.S.S.W.B.S. Relator: Des. Luiz Ari Azambuja Ramos, 24 de maio de 2007. Disponível em: https://www.tjrs.jus.br/buscas/jurisprudencia/exibe_html.php. Acesso em: 10 nov. 2023.

  • RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cìvel nº 70022775605. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL PARALELA AO CASAMENTO E OUTRA UNIÃO ESTÁVEL. UNIÃO DÚPLICE. POSSIBILIDADE. PARTILHA DE BENS. MEAÇÃO. "TRIAÇÃO ". ALIMENTOS. A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união estável entre a autora e o réu em período concomitante ao seu casamento e, posteriormente, concomitante a uma segunda união estável que se iniciou após o término do casamento. Caso em que se reconhece a união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a esposa, a companheira e o réu. Meação que se transmuda em "triação", pela duplicidade de uniões. O mesmo se verificando em relação aos bens adquiridos na constância da segunda união estável. Eventual período em que o réu tiver se relacionado somente com a apelante, o patrimônio adquirido nesse período será partilhado à metade. Assentado o vínculo familiar e comprovado nos autos que durante a união o varão sustentava a apelante, resta demonstrado os pressupostos da obrigação alimentar, quais sejam, as necessidades de quem postula o pensionamento e as possibilidades de quem o supre. Caso em que se determina o pagamento de alimentos em favor da ex-companheira. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível, Nº 70022775605, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em: 07-08-2008). Assunto: 1. DIVISÃO EM TRÊS PARTES. TRIAÇÃO. 2. UNIÃO ESTÁVEL DÚPLICE OU PARALELA. RECONHECIMENTO. REQUISITOS. TERMO INICIAL. PROVA. DISSOLUÇÃO. PARTILHA DE BENS. CRITÉRIO. MEAÇÃO OU TRIAÇÃO. DIVISÃO ENTRE ESPOSA, COMPANHEIRA E COMPANHEIRO. 3. ALIMENTOS. EX-COMPANHEIRA. COMPANHEIRA. CRITÉRIO PARA SUA FIXAÇÃO. FIXAÇÃO. CABIMENTO. 4. PARTILHA DE BENS. FORMA. MEAÇÃO. TRIAÇÃO. 5. MARCOS TEMPORAIS DA UNIÃO ESTÁVEL E CASAMENTO. 6. COMPANHEIRO CASADO. 7. SUCUMBÊNCIA PARCIAL. CUSTAS E HONORÁRIOS DE ADVOGADO. RESPONSABILIDADE. 8. TEORIA DO PORTANOVA. RUI PORTANOVA. ​​ Referência legislativa: CC-1723 PAR-1 DE 2002 NCC-1723 PAR-1 CC-1658 DE 2002 NCC-1658 CC-1725 DE 2002 NCC-1725 CC-1694 DE 2002 NCC-1694. Jurisprudência: APC 70017045733 APC 70012696068 APC 70011258605 APC 70010787398 APC 70006046122 APC 70006936900 APC 70019387455 APC 70011258605. Apelante: A.C.R. Apelado: C.F.R. Relator: Des. Rui Portanova, 07 de agosto de 2008. Disponível em: https://www.tjrs.jus.br/buscas/jurisprudencia/exibe_html.php. Acesso em: 11 nov. 2023.

  • GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume 6: direito de família. 13. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023. p. 168-170.

  • BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 931155/RS. Direito civil. Família. Recurso especial. Ação de reconhecimento de união estável. Casamento e concubinato simultâneos. Improcedência do pedido.- A união estável pressupõe a ausência de impedimentos para o casamento, ou, pelo menos, que esteja o companheiro(a) separado de fato, enquanto que a figura do concubinato repousa sobre pessoas impedidas de casar.- Se os elementos probatórios atestam a simultaneidade das relações conjugal e de concubinato, impõe-se a prevalência dos interesses da mulher casada, cujo matrimônio não foi dissolvido, aos alegados direitos subjetivos pretendidos pela concubina, pois não há, sob o prisma do Direito de Família, prerrogativa desta à partilha dos bens deixados pelo concubino.- Não há, portanto, como ser conferido status de união estável a relação concubinária concomitante a casamento válido. Recurso especial provido. Recorrente: A.M. de O. Recorrido: N. da S.C. Relatora: Ministra Nancy Andrighi, Brasília, 07 de agosto de 2007. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=200700467356&dt_publicacao=20/08/2007. Acesso em: 11 nov. 2023.

  • BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1754008/RJ. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PEDIDO DE ARROLAMENTO E PARTILHA DE BENS. UNIÃO ESTÁVEL CONCOMITANTE A CASAMENTO SEM SEPARAÇÃO DE FATO. 1. À luz do disposto no § 1º do artigo 1.723 do Código Civil de 2002, a pedra de toque para o aperfeiçoamento da união estável não está na inexistência de vínculo matrimonial, mas, a toda evidência, na inexistência de relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica. Nesse viés, apesar de a dicção da referida norma também fazer referência à separação judicial, é a separação de fato (que, normalmente, precede a separação de direito e continua após tal ato formal) que viabiliza a caracterização da união estável de pessoa casada. 2. Consequentemente, mantida a vida em comum entre os cônjuges (ou seja, inexistindo separação de fato), não se poderá reconhecer a união estável de pessoa casada. Nesse contexto normativo, a jurisprudência do STJ não admite o reconhecimento de uniões estáveis paralelas ou de união estável concomitante a casamento em que não configurada separação de fato. 3. No caso dos autos, procedendo-se à revaloração do quadro fático delineado no acórdão estadual, verifica-se que: (a) a autora e o réu (de cujus) mantiveram relacionamento amoroso por 17 anos; (b) o demandado era casado quando iniciou tal convívio, não tendo se separado de fato de sua esposa; e (c) a falta de ciência da autora sobre a preexistência do casamento (e a manutenção da convivência conjugal) não foi devidamente demonstrada na espécie, havendo indícios robustos em sentido contrário. 4. Desse modo, não se revela possível reconhecer a união estável alegada pela autora, uma vez que não foi atendido o requisito objetivo para sua configuração, consistente na inexistência de relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica. 5. Uma vez não demonstrada a boa-fé da concubina de forma irrefutável, não se revela cabida (nem oportuna) a discussão sobre a aplicação analógica da norma do casamento putativo à espécie. 6. Recursos especiais do espólio e da viúva providos para julgar improcedente a pretensão deduzida pela autora. Recorrente: H F – Espólio e A M B F. Recorrido: M da F. Relator: Ministro Luis Felipe Salomão, Brasília, 13 de dezembro de 2018. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201801766525&dt_publicacao=01/03/2019. Acesso em: 11 nov. 2023.

  • TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. p. 443.

  • BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança 33555/DF. EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. EX-SERVIDOR DA FUNAI. PENSÃO CIVIL VITALÍCIA. PAGAMENTO PARA CÔNJUGE E COMPANHEIRA. NEGATIVA DE REGISTRO. DETERMINAÇÃO DE REFAZIMENTO DO ATO. UNIÃO ESTÁVEL E CONCUBINATO: INSTITUTOS DISTINTOS. PRECEDENTE. INDEFINIÇÃO SOBRE A SITUAÇÃO DA IMPETRANTE. LEGALIDADE DO ATO IMPUGNADO. MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO. 1. O reconhecimento da ausência de base legal para o rateio da pensão entre viúva e alegada companheira está fundado na impossibilidade jurídica de concomitância dessas duas situações, conforme expresso no julgamento do Recurso Extraordinário n. 397.762/BA (Relator o Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma), quando assentada a distinção entre os institutos da união estável e do concubinato, sendo não acolhido no sistema previdenciário brasileiro. 2. O ato do Tribunal de Contas da União, fundado no inc. III do art. 71 da Constituição da República, é inconclusivo sobre a situação da Impetrante e dos demais interessados, não se havendo cogitar de lesão a direito subjetivo decorrente de relação fático-jurídica incontroversa. 3. Mandado de segurança denegado, cassando-se a liminar antes deferida e julgando-se prejudicado o agravo regimental interposto. Impetrante: Maria Otacilia Simões Alves. Impetrado: Presidente do Tribunal de Contas da União. Relatora: Ministra Cármen Lúcia, Brasília, 06 de outubro de 2015. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=9730746. Acesso em: 13 de nov. 2023.

  • BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 883168/SC. EMENTA Direito Previdenciário e Constitucional. Recurso extraordinário. Sistemática da repercussão geral. Tema nº 526. Pensão por morte. Rateio entre a concubina e a viúva. Convivência simultânea. Concubinato e Casamento. Impossibilidade. Recurso extraordinário provido. 1. Assentou-se no acórdão recorrido que, comprovada a convivência e a dependência econômica, faz jus a concubina à quota parte de pensão deixada por ex-combatente, em concorrência com a viúva, a contar do pedido efetivado na seara administrativa. Tal orientação, contudo, contraria a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do processo paradigma do Tema nº 529 sob a sistemática da repercussão geral, in verbis: “A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro”. 2. Antes do advento da Constituição de 1988, havia o emprego indistinto da expressão concubinato para qualquer relação não estabelecida sob as formalidades da lei, daí porque se falava em concubinato puro (hoje união estável) e concubinato impuro (relações duradoras com impedimento ao casamento). Erigida a união estável, pelo texto constitucional (art. 226, § 3º, da CF), ao status de entidade familiar e tendo o Código Civil traçado sua distinção em face do concubinato (art. 1.723, § 1º, c/c art. 1.521, VI e art. 1.727 do CC), os termos passaram a disciplinar situações diversas, o que não pode ser desconsiderado pelo intérprete da Constituição. 3. O art. 1.521 do Código Civil – que trata dos impedimentos para casar -, por força da legislação (art. 1.723, § 1º), também se aplica à união estável, sob claro reconhecimento de que a ela, como entidade familiar, também se assegura proteção à unicidade do vínculo. A espécie de vínculo que se interpõe a outro juridicamente estabelecido (seja casamento ou união estável) a legislação nomina concubinato (art. 1.727 do CC). Assim, a pessoa casada não pode ter reconhecida uma união estável concomitante, por força do art. 1.723, § 1º, c/c o art. 1.521, VI, do Código Civil. 4. Considerando que não é possível reconhecer, nos termos da lei civil (art. 1.723, § 1º, c/c art. 1.521, VI e art. 1.727 do Código Civil Brasileiro), a concomitância de casamento e união estável (salvo na hipótese do § 1º, art. 1.723, do CC/02), impende concluir que o concubinato – união entre pessoas impedidas de casar - não gera efeitos previdenciários. 5. A exegese constitucional mais consentânea ao telos implícito no microssistema jurídico que rege a família, entendida como base da sociedade (art. 226, caput, da CF), orienta-se pelos princípios da exclusividade e da boa-fé, bem como pelos deveres de lealdade e fidelidade que visam a assegurar maior estabilidade e segurança às relações familiares. 5. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “É incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável”. 6. Recurso extraordinário a que se dá provimento. Recorrente: União. Recorrido: Rosemary do Rocio de Souza. Relator: Ministro Dias Toffoli, Brasília, 03 de agosto de 2021. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=757642319. ​​ Acesso em: 13 nov. 2023.

  • TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. p. 441.

  • SIMÃO, José Fernando. Sim, eu tinha razão e o STF confirmou que não há famílias paralelas no Brasil. Conjur, São Paulo, 20 dez. 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-dez-20/processo-familiar-stf-confirma-nao-familias-paralelas-brasil/. Acesso em: 13 nov. 2023.

  • HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Famílias Paralelas. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 108, p. 199-219, jan./dez. 2013. p. 7. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/download/67983/70840/89950. Acesso em: 13 nov. 2023.

  • GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume 6: direito de família. 13. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023. p. 171.

  • TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. p. 441.

 

     

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Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, Franca/SP, Brasil.


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