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Scientific Society Journal  ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​​​ 

ISSN: 2595-8402

Journal DOI: 10.61411/rsc31879

REVISTA SOCIEDADE CIENTÍFICA, VOLUME 7, NÚMERO 1, ANO 2024
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ARTIGO ORIGINAL

Mestres de marionetes: Um olhar da TCC sobre a ponerologia

Yago Cesaroni Nolasco1; Danielle Castelões Tavares de Souza2

 

Como Citar:

Como Citar:

NOLASCO, Yago ​​ Cesaroni; DE SOUZA, Danielle Castelões Tavares. Mestres de marionetes: Um olhar da TCC sobre a ponerologia. Revista Sociedade Científica, vol.7, n. 1, p.3485-3501, 2024.

https://doi.org/10.61411/rsc202453517

 

DOI: 10.61411/rsc202453517

 

Área do conhecimento: Psicologia.

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Sub-área: Psicologia clínica, Psicologia Social.

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Palavras-chaves: Ponerologia; terapia; cognitiva comportamental; psicopatia; política..

 

Publicado: 13 de agosto de 2024.

Resumo

O presente artigo tem como objetivo trazer ao debate à luz da Teoria Cognitiva - Comportamental, uma análise histórica e contextual da Ponerologia. Poneros, em grego, significa Maldade, Malícia. Logo, a ponerologia é o contexto sociopolítico da prática do mal. A primeira vez que o termo foi citado, foi através do psicólogo polonês Andrzej Łobaczewski. Andrzej viveu a maior parte de sua vida no período ditatorial da antiga URSS, seu livro “Ponerologia: Psicopatas no poder¹ precisou por 3 vezes ser reescrito até chegar a formatação que foi divulgada em todo o mundo. Nas duas primeiras, o mesmo precisou destruir seu material de pesquisa coletado e categorizado, devido a batidas de inspeção realizada em seu imóvel pelo temido serviço secreto soviético (KGB). Para escrever este artigo, foi utilizado o método de pesquisa histórica tendo como ideia central a contextualização do cenário socio-político, não só do passado, mas também do hoje e do futuro. Como pistas do resultado, à luz da TCC, fica evidenciado que uma vez identificados alguns comportamentos vistos no decorrer do tempo como autoritários e de risco a integridade humana, pode-se evitar futuras tentativas de ascensão ao poder por parte de indivíduos patologicamente e socialmente falando, incapazes de assumir posições de liderança hierárquica em qualquer esfera social.

 

 

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1. Introdução

A ponerologia é o contexto sociopolítico da prática do mal. Não se deve considerar esse estudo uma análise comportamental sobre a ditadura soviética, ou dos regimes extremistas de esquerda, mas sim, de todos os padrões comportamentais dos regimes totalitários ao redor do mundo. Remontando cenários históricos como a Itália fascista de Mussolini, a Alemanha Nazista de Hitler e também, palcos de ditaduras guiadas por crenças religiosas

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2.Desenvolvimento e discussão

2.1 A Psicopatia 

Para entender a aplicação política e social, primeiro, precisaremos revisitar alguns conceitos já conhecidos sobre a psicopatia. Isso parte do entendimento já comum de que a chamada psicopatia se origina na ideia de “mente adoecida”, como ficou popularizado o conceito de forma pejorativa, ou seja, pessoas que vivem numa pequena porcentagem da sociedade e possuem deficiências cognitivas e emocionais, causando uma interpretação errônea dos conceitos da estruturação social, apresentando uma baixa capacidade de respeitar, interpretar e expressar suas emoções. Em casos mais específicos, essa falha comportamental resulta em ações atrozes (em número bem menor) gerando assim aqueles que já se tornaram conhecidos no imaginário popular e da cultura ficcional, os chamados Serial Killers. 

Mas a coisa não vai somente até aí. Segundo inúmeras pesquisas realizadas, a psicopatia, formalmente conhecida como TPAS (Transtorno da Personalidade Antissocial)², também é possível de ser administrada, sendo uma vez reconhecida e analisada pelo corpo científico ligado a medicina, psicologia e neurologia, e também a adequação ao acompanhamento a entendimento por parte daqueles que apresentam tal transtorno.

Na verdade, é bem possível que devido a essa oscilação emocional, até mesmo algumas posições do ponto de vista empregatício e que contribuem de grande maneira para a sociedade sejam propícias para indíviduos que possuem tal condição, o que vai listado desde médicos cirurgiões, militares de elite e em alguns casos, atletas de alta performance. 

A TPAS tem ação através de uma alteração / lesão no córtex pré-frontal. Essa região do cérebro, é diretamente responsável pelas ações ligadas a personalidade, tomada de decisões, interpretações pessoais e formação das opiniões, gostos e costumes do indíviduo. A mesma região corresponde por boa parte do sistema emocional e do Quoeficiente Inteligente, aonde as informações e vivências que chegam a pessoa são organizadas, agrupadas e categorizadas, e também, aonde se armazenam os conceitos gerais da convivência social (APA, DSM-5, 2013). Pessoas nessa condição, apresentam comportamento inadequado, e, em alguns casos, uma inclinação ao narcisismo, exatamente porque não é capaz de interagir e compreender as questões sociais e o entendimento de valores por terem uma visão equivocada dos fatos, acreditando que sua personalidade pessoal possui superioridade em termos de relevância, o que pode acarretar situações que o mesmo promova um destaque e se aproprie da ideia de ser o centro das atenções em âmbitos sociais de qualquer natureza.

Outros comportamentos visíveis, é o de negligenciar a segurança de si ou de terceiros, o menosprezo pelas emoções de outros indíviduos, o eterno sentimento de necessidade de adrenalina, o que pode provocar ações ligadas ao comportamento negligente mencionado anteriormente. 

Segundo o psicólogo Kevin Dutton (2012)³, existe uma escala de loucura em cada indíviduo, aonde até mesmo os psicopatas possuem variações de grau escalonado, dos mais leves até os mais complexos (e, por sorte, mais raros). Para outros especialistas no assunto, como o psicólogo canadense Jordan B. Peterson (2021), a psicopatia também possui relações diretas com o maquiavelismo, uma vez que esses comportamentos apresentados nos casos mais complexos resultam em ações catastróficas e de enorme repercussão, em algumas das vezes, mundial, como ataques a tiros em escolas, atos terroristas de todo tipo e ações desordenadas por parte de indíviduos que, mesmo retirados da sociedade, não obtiveram o acompanhamento e tratamento adequados, e ao retornar à liberdade, obtém sentimentos ainda piores do que apresentados anteriormente.

Muito do que se sabe sobre a psicopatia nos nossos tempos, também se apoia na cultura pop. Séries, filmes, livros e documentários, principalmente ligados aos assassinos em série, já possuem forte influência na cultura, principalmente ocidental. É claro que muito desse movimento é feito de forma fantasiosa, focando única e exclusivamente no ganho financeiro, e não na informação de embasamento científico e comprovado das teorias sobre o TPAS, fomentando assim um imaginário além daquele que realmente é possível de se constatar e formular estudos e análises

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2.2 Os âmbitos de poder 

Aqui se inicia a segunda parte desse artigo, aonde se faz uma análise ainda profunda sobre a psicopatia (ou, sociopatia) e no meio em que a maioria deles consegue reproduzir mais fielmente seus frutos: No topo das hierarquias

Como dito anteriormente, esses indíviduos tem inclinações profundas ao egocentrismo, e a inadequação dos padrões sociais e o comportamento narcisistas dos TPASs, podem conduzi-los a posições de destaque social, exatamente por o diferenciarem dos demais. Historicamente, se obtiveram relatos infinitos à respeito de pessoas de, digamos, modos curiosos de agir chegarem as lideranças das massas em todos os níveis sociais. Das classes mais baixas até as mais altas, não é difícil de ver indíviduos de ações e personalidades duvidosas liderando religiões, seitas, partidos, grupos, lobbys e até mesmo estados. Aonde desejar encontrar possíveis psicopatas, olhe para o alto. Há uma grande chance de um deles estar no topo da cadeia alimentar a qual você pertence. 

Um dos casos mais famosos, é o do famigerado líder de seita Charles Manson, que, nos anos de 1960, liderou uma seita formada em maioria esmagadora por jovens hippies de Los Angeles, nos Estados Unidos. Para um entendimento melhor do que originou tal seita, Manson alegava que recebeu orientações e ordens para liderar uma guerra racial na América e que, posteriormente, atingiria o mundo e aonde os negros seriam derrotados e os brancos possuíriam tal poder. Discursos de ódio de classes e raças não são tão raros no decorrer da história da humanidade, a questão toda é que Manson dizia ter recebido tal direcionamento através do White Album, da banda The Beatles. Mais precisamente, através da canção Helter Skelter. Nem é preciso mencionar, que nem o álbum, nem a canção, muito menos os 4 garotos de Liverpool conheceram Manson ou deram tal orientação desse tipo a qualquer pessoa.

O caso Manson parecia apenas o discurso de um lunático até que se chegou exatamente aonde se pretendia: O topo. Na noite de 9 de agosto de 1969, um grupo de jovens liderados por Manson (que não estava presente na cena) realizou o assassinato da atriz Sharon Tate. A mesma, estava grávida e foi assassinada juntamente com amigos que estavam em sua residência. Mas o show de horrores de Manson e seu grupo estava apenas começando.

          No julgamento do caso, foram vistas cenas no mínimo curiosas. Pessoas seguidoras da seita, agiam como animais aos arredores do Tribunal aonde o caso era julgado e Manson e seus comparsas recebiam duras penas da justiça americana. Seus depoimentos se tornaram famosos de forma sombria na cultura pop, assim como muitas das entrevistas dadas pelo mesmo atrás das grades, no anos que se seguiam até sua morte em 2017. Foi constatado por psicólogos e psiquiatras que participavam do júri, que os membros da seita de Manson eram formados majoritariamente por jovens, principalmente meninas, que possuíam baixa auto-estima, necessidade do pertencimento social por se sentirem excluídas de outros grupos no decorrer de suas vidas e por unanimidade com problemas familiares. O caso ajudou a constatar que pessoas como Manson eram capazes de manipular massas desde que fossem realmente vulneráveis ao tipo de discurso apresentado por ele, fenômeno esse que é observado de outras formas na história das sociedades. 

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2.3 A política 

Após a contextualização, vamos ao tema central da ideia da ponerologia: A política. Andrzej esteve diretamente inserido no contexto da guerra fria, a ameaça nuclear e a divisão global dos pólos capitalista americano e comunista / socialista dos soviéticos. Ambos, se aliaram na segunda guerra mundial lutando contra o eixo nazi-fascista do qual falaremos posteriormente, mas se dividiram após isso, temendo as ações uns dos outros no âmbito político e militar. A Polônia, terra natal de Andrzej, foi invadida e tomada pelos soviéticos a força e teve seu território anexado. O combate as liberdades individuais e a perseguição a cientistas, fomentaram ainda mais os estudos e a curiosidade de Andrzej. O mesmo, montou toda uma pesquisa sobre o que aconteceu com sua região e as revoluções do século XX, buscando compreender como sociedades em todos os continentes, foram direcionadas de tal maneira para caminhos tão extremistas. 

No caso dos soviéticos, eles souberam exatamente aonde agir no seio de uma sociedade que clamava por mudanças. Segundo Andrzej, o político não precisa se preocupar com o entendimento das massas à respeito da sua interpretação política, financeiramente, social, diplomática e econômica, desde que ele possua o entendimento humano daquilo que está ao seu redor. A revolução bolchevique teve como base central para suas ações, a insatisfação do povo russo com a família real e o imperialismo que até então deu as diretrizes e princípios do país. Uma Rússia mergulhada na pobreza, da desigualdade e ainda por cima, atuante na linha de frente da primeira guerra mundial, formaram o contexto sociopolítico necessário para fomentar uma revolução, na qual atuou por duas vertentes: Uma, no meio social, das classes operárias e de campo, lideradas por Vladimir Lênin (1870-1924) e no âmbito científico e acadêmico, liderado por Leon Trótsky (1879-1940). Ambas se atacavam em alguns cenários, mas trabalhavam juntas em prol de um mesmo objetivo: a revolução socialista. 

Os caminhos traçados por Lênin se mostraram mais eficazes. Guiado pela ira contra a família real e o império, desencadeou não apenas a revolta e guerra civil mas também a retirada das tropas do teatro de operações da primeira guerra. Um saldo de aproximadamente 60 milhões de mortos e o combate a religiões e práticas ocidentais que eram consideradas obras do capitalismo, foram combatidas duramente a partir de 1917 aonde se desencadeou o confronto. Pela primeira vez na história, o Comunismo seria testado na prática

O poder de persuasão de líderes como Lênin, era a potência que poderia ser usada para liderar massas ao redor do mundo, independente de suas ideologias. Tempos mais tarde, em uma Alemanha massacrada pela primeira guerra, um jovem austríaco que serviu nas linhas de frente como mensageiro chamado Adolf Hitler, apoiou suas teses políticas em argumentos que remontavam períodos milenares (e sem comprovações científicas verídicas) de que os germânicos possuíam em sua maioria esmagadora, os genes mais puros no que ele acreditava ser a hierarquia das raças, principalmente, aonde os povos arianos habitaram séculos antes e que as altas taxas e apropriações impostas pelo restante do mundo em especial os judeus, eram um dos fatores que impediam a ressurreição do poderio alemão que outrora foi tão louvado. No desejo de vingança dos muros derrubados, casas bombardeadas e filhos mortos pela guerra, Hitler plantou as sementes do nacional-socialismo, que, como dito anteriormente, se baseava na verdade única e exclusivamente no sentimento populacional, e não em seu entendimento e perícia sobre os acontecimentos recentes. Ali, décadas após a revolução russa, se iniciava outra ideologia guiada por uma mente transtornada, narcisista e maquiavélica que geraria outra batalha sangrenta dos povos do mundo. 

Andrzej deu o pontapé inicial em seus estudos ainda na faculdade, num período que era ainda novo da história soviética. Os seus companheiros de classe, que, assim como ele, a vida toda foram educados pelos grandes mestres da filosofia, mal podiam conter-se com a ideia de agora conhecerem grandes desses nomes filosóficos e das ciências sociais em suas salas de aula. O banho de água fria veio quando no momento grandemente aguardado, se depararam com figuras na posição de mestres que mais abrangiam um ciência inclinada pelas ideologias do regime ditatorial vigente, do que pelas verdades já conhecidas e estudadas a séculos por mentes brilhantes anteriores. A sua observância dos fatos iniciou vendo a inclinação esmagadora dos jovens das universidades russas (agora, socialistas soviéticas) a esses conhecimentos e aonde ele se deu conta de um dos primeiros atos desse tipo de revolução: Para formarem uma nova sociedade embasada pelos ensinamentos agora impostos, precisariam atacar as bases mais jovens da sociedade, em outras palavras, a sociedade do amanhã. 

Assim como Manson nos anos 1960, ficou claro o entendimento de que os jovens por sua fase impulsiva e borbulhante e do seu desenvolvimento cognitivo, químico e biológico, eram as massas de manobra ideais para se atingir certos pontos. Andrzej cita em sua obra que a manipulação através dessas pessoas é um meio mais fácil de se moldar padrões de sociedade, uma vez que os mesmos não são em sua maioria, capazes de perceber que suas ações e crenças são guiadas e pré-programadas por outras mentes. 

Um dos fatores principais que Andrzej aponta para a ascensão do mal nas sociedades é o combate as individualidades. Uma vez que os povos abraçam uma ideia de estarem cooperando para algo maior, alimentados por um desejo angustiante de mudanças em suas estruturas gerais, eles estarão dispostos a sacrificar até mesmo suas particularidades mais íntimas em prol daquilo que acreditam ser “o bem maior”. Isso ficou notório no decorrer da história em todas as nações que experimentaram (ou foram impostas a experimentar) regimes totalitários. A perda de autonomia, a morte da cultura e a repressão da natureza dos seres humanos é uma das formas mais cruéis de manipulação e controle das massas. Uma sociedade que sacrifica sua história, automaticamente, estará fadada a sacrificar toda sua linhagem. 

Para Andrzej, somente princípios democráticos reais, bem paramentados e direcionados e uma sociedade pulsante são a fórmula perfeita para impedir tamanha marcha em direção ao poder por parte daqueles que são mal-intencionados. 

Há muito tempo, em uma galáxia muito, muito distante…” 

Uma das escaladas do mal ao poder mais notáveis é encontrada na ficção através da obra de George Lucas, Star Wars (1977). Esta ópera espacial narra a luta das forças do bem contra o mal em um universo de vida multi-alienígena futurística, em que os cavaleiros jedi combatem as ações de mal-feitores e o império constituído por um dos vilões mais lendários do cinema: Darth Vader. E ele servirá de alegoria de entendimento para o nosso estudo. 

Inicialmente, nos anos de 1999, o filme Star Wars: A Ameaça Fantasma⁶, nos apresenta o pequeno e jovem escravo, Anakin Skywalker. Anakin, junto com sua mãe escrava vivem no planeta Tatooine. A história nos mostra um menino com habilidades e virtudes natas para ser um jedi. O pequeno Skywalker possuía o chamado vigor necessário para trazer equilíbrio à chamada ​​ força (uma analogia do uso do bem). 

Porém, no decorrer das obras seguintes da trilogia, nos deparamos com uma realidade diferente. Anakin, mesmo após deixar a escravidão, é impelido de deixar para trás sua mãe ainda como escrava, em busca do treinamento jedi⁷. Suas habilidades como soldado e piloto encantam à todos e constroem o enredo daquilo que promete ser uma das maiores tramas ligadas à denominada jornada do herói. Entretanto, a amargura, o desejo de crescimento e a vontade avassaladora de resgatar sua mãe, são capazes de corromper os objetivos de Anakin e o mesmo, impelido pelo Lorde sombrio, Palpatine, decide inclinar-se ao lado negro. Fato esse, que é alimentado pelo fato de que numa operação quase que suicida e não autorizada, Anakin vai à Tatooine na esperança de resgatar sua mãe, a mesma, falece em seus braços e, tomado pela fúria, Skywalker despeja sua fúria sobre todos os inocentes da aldeia⁸.

Aqui abriremos um paralelo breve de explicação: Um dos atos mais notáveis dos regimes ditatoriais e magicamente bem descrito na obra galática é de que psicopatas como Anakin seriam capazes de direcionar sua ira e desejo pessoal para inocentes. Isso é visto mais tarde na história quando o mesmo organiza seus exércitos e assume a forma general das forças obscuras. Mesmo que acreditando ser bem intencionado, uma pessoa mal resolvida e com patologias clínicas ligadas a TPAS pode ser capaz de assumir posições de destaque e persuasão uma vez que lhes é dado o poder e conhecimento suficientes. Sem o devido controle e observância do uso dessas atribuições. Star Wars deixa ao público uma das maiores lições ponerogênicas da história quando impelido pelo medo da escravidão, da perda da mãe e de não atingir os objetivos depositados sobre si, Anakin se rebela e mantém sob jugo toda uma galáxia que sabia que não seria pária para conter sua força. Como bem diz o grande Mestre Yoda, mentor dos cavaleiros jedis: “O medo é o caminho para o lado obscuro”

Aquilo que você procura se encontra aonde você não pensa em buscar 

Essa linha de pensamento já foi replicada historicamente por diversos autores em tempos, mundos e circunstâncias absolutamente diferentes. Uma das principais razões para a perpetuação de regimes de poder autoritários é a mania de olhar para algo que se apresenta como preocupante e desvia toda a atenção (às vezes, propositalmente) enquanto outro tentáculo surge por trás dos panos, pronto para enlaçar a todos. Como um truque de ilusionismo, aqueles que seguem o caminho de desejo do poder podem distrair seus espectadores com atos dos quais não valeriam sua real atenção, se soubessem exatamente o que estavam procurando (e que, no geral, rendem espanto e surpresa no momento final). 

Bakunin (1814-1876) citou certa vez que até mesmo o mais ardente dos revolucionários poderia se tornar tão mau quanto o Czar uma vez que alcançasse o poder. Antecessor da revolução bolchevique e com essa frase, quase um vidente do que estaria por vir, Mikhail Bakunin soube prever que no seio de um desejo de liberdade, revolução e aspirações à mudanças sociais latentes, também se escondia a possibilidade de estrutura um mal maior. Fato esse também observado na Alemanha pós primeira guerra, que dentro de um contexto de miséria, desordem, humilhação e pobreza, na figura de um veterano de discurso revolucionário, mergulhou no pior caos de destruição que a humanidade já viu, gerando um confronto mais sangrento do que aquela que teria sido a guerra que acabaria com todas as guerras.

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2.4O olhar da TCC10

Um dos principais enfoques da terapia cognitiva-comportamental é a análise pelo padrão de comportamento. A TCC utiliza das suas técnicas de aplicação mais notáveis para que o paciente encontre as respostas (ou, reformule corretamente os questionamentos) sobre si mesmo e aquilo que está em sua volta. Como exemplo, o registro de pensamentos disfuncionais, aonde se trabalham as ideias, emoções e sentimentos expressados ou não pelo indivíduo diante do dilema apresentado em sessão, o questionamento socrático, aonde o terapeuta formulará junto ao paciente, indagações sobre o objeto proposto afim de que se alcance um denominador final nos seus anseios (aonde também muitas das vezes, descobre-se que o problema estava bem diante de seus olhos) e aquele o qual pode trazer dados mais significativos do ponto de vista ponerogênico da TCC: O de observador distante, notável pela ação de que a distância estabelecida entre a situação e seu observador, se tornam mais eficazes para a compreensão da causa existente. 

Vale ressaltar que até aonde essa pesquisa pôde buscar relatos, não existem até então dados que liguem a terapia cognitiva-comportamental e a ponerologia, e isso pode ser implicado principalmente pela questão de que a ponerologia possui toda uma característica social se comparada a TCC que trabalha justamente com os processos individuais. Implicação essa que foi o fator primordial para identificação de uma possível correlação entre as duas. 

Voltando-se as técnicas utilizadas pela TCC, vamos trabalhar primeiramente com a da observação a distância. Andrzej em suas pesquisas, identificou traços clínicos extremamente comuns em líderes ditatoriais, os quais serão difundidos aqui. 

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2.5Egotismo 

Não é de se surpreender que a personalidade egóica seja o topo da lista das possibilidades a serem notadas em comportamentos ditatoriais. A máscara carregada de simbologia, ódio, dominação e o chamado culto a personalidade, são fatores preponderantes para aqueles que maliciosamente possuem o desejo de domínio e perversão social (em qualquer esfera, não somente governamental). Segundo o próprio Lobaczewski: O egotismo atrasa a evolução normal da personalidade, porque estimula a dominação da vida subconsciente e torna difícil aceitar os estados desintegrativos que podem ser muito proveitosos para o crescimento e desenvolvimento.(Lobaczewski, 2014). Na psicologia, muito da personalidade egotista também pode ser chamada de Narcisista devido a sua natureza abusiva, com ares de superioridade, repleta de características dominantes totalitárias aonde se alimentam de prezas fáceis ou manipuláveis, reféns de algum tipo de sentimento de veneração ao outro ou inferiorização de si mesmo. Uma das técnicas da TCC que mais podem corroborar na identificação dessa personalidade é a de Psicoeducação na qual a pessoa aprende a lidar com aquilo que sente, ou até mesmo algum tipo de trauma ou síndrome identificada (fobia social, por exemplo). O auxílio psicológico no desenvolvimento de inteligência emocional e auto-análise são figuras indispensáveis no combate ao estabelecimento de poder de personalidades narcísicas e egotistas, através da observação de discursos e ações, em especial, aquelas proferidas diante aglomeração social e situações de crise. 

Segundo o autor, muito do egotismo patológico também é alimentado pelo desejo incessante do indivíduo de estabelecer um padrão de concordância social que elimina a figura de indivíduo baseado num falso pretexto de coletividade moral. Em outras palavras, a instituição de ideias e ações de caráter do que se denomina politicamente correto dentro do contexto inserido. Sentir e pensar como elas é um dos passos fundamentais para o estabelecimento de dominação, tanto individual, quanto coletiva. 

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2.6Interpretação Moralizante

Aqui nos pautamos por duas técnicas mencionadas anteriormente. O questionamento socrático e observação distante. A interpretação moralizante é construída pela maneira de atribuir valores morais a opiniões coletivas fundando um senso comum (paramoralismos). Didaticamente falando, pensaremos um grupo que estipula um posicionamento X sobre determinado assunto. Uma vez que estabelecido esse posicionamento (fundado ou não), cria-se ali um determinante comum e de valor inquestionável, no qual um outro indivíduo de pano de fundo possuidor do posicionamento Y seja automaticamente instituído como incorreto, ou até mesmo, se tratando de questões socio-políticas, subversivo. 

          ​​ O método socrático ganha vida a partir do momento em que mediante as circunstâncias apresentadas, a pessoa chega a um determinante diferente do estipulado (em que muitas vezes, percorre historicamente por diversas gerações). Podemos colocar como exemplo, a ideia de união de pessoas do mesmo sexo. Na história antropológica, em especial do ocidente, sempre ocorreu uma determinação em proibir e coibir a prática (ou ao menos, torná-la pública) e isso se deve a fatores diversos desde questões ideológicas (haja vista, a união soviética que baseava-se no argumento de que os homossexuais não teriam como gerar vidas, logo, não colaborariam para o progresso soviético) e também de posicionamentos religiosos. 

A observação distanciada ajudará a construir o argumento socrático uma vez que inserido no contexto social aonde o chamado anteriormente posicionamento X se encontra latente, fará com que o homem possa fazer uma leitura do porque aquela ideia foi tão difundida, alimentada e enraizada. Ali, escancaram-se os absurdos aos olhares mais atentos e do qual a pessoa pode também iniciar um novo movimento de resposta à toda situação proposta, ou, em casos ditatoriais, não se curvar aquela ideia mesmo que esteja com suas mãos atadas para iniciar algum ato de mudança significativo. 

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2.7 Bloqueio reversivo 

Talvez essa seja a atitude mais notabilizada em estrutura sociais sem exercício democrático. O bloqueio reversivo consiste em fundar uma verdade de tal forma que qualquer ideia que se oponha a mesma seja taxada como falsa e facilmente desconsiderada. Muito antes da visão ponerogênica existir, o bloqueio reversivo é usado em todos os âmbitos e em larga escala de tal forma que soa como natural. Não raramente, vemos indivíduos que se pautam por opiniões herdadas cultural ou até mesmo familiarmente das quais nunca se quer foram capazes de refletir a respeito para encontrar uma resposta adequada. Até por questões culturais, duvidar ou questionar a fala / atitude de uma pessoa hierarquicamente superior soaria como desrespeitoso e gerariam crises, brigas, divisões ou até mesmo a exclusão social daquele indivíduo do meio inserido.

A TCC e outras abordagens também podem colocar essa ação dentro do nicho das crenças limitantes. É impossível mensurar o que há atrás do muro se a ideia de apoiar uma escada sobre ele seria inapropriada, invasiva ou até mesmo ofensiva contra o que se pode ter do outro lado ou com quem instituiu tal regra. Nessas características, também vemos o potencial da maldade de uma pessoa, quando ela age de maneira consciente a respeito do assunto (ela pode estabelecer futuramente uma nova ideia do porque não se deve apoiar uma escada no muro e assim criar seu próprio método de domínio). Ou, quando a pessoa age de maneira inconsciente, e, com ajuda clínica, ela é capaz de descobrir que ao apoiar a escada no muro pode ajudá-la a contemplar um lindo jardim ou um cenário de destruição absoluta. Como bem disse o autor britânico C.S. Lewis em uma de suas obras, “você não consideraria uma pessoa boa por retirar as ratoeiras de sua casa se isso se devesse ao fato de que ela parou de acreditar que existem ratos lá.” ( Lewis,1941). 

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2.8 Seleção e substituição de informação

Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”. Essa famosa afirmação popular não ironicamente parte de um dos braços ditatoriais mais notáveis da história. A afirmação é atribuída ao ministro da propaganda do terceiro reich nazista, Joseph Goebbels (1897-1945). Propagandista de profissão, genocida por vocação, Goebbels que era conhecido por ser braço direito de Adolf Hitler, foi um dos maiores extensores da propaganda e ideologia nazista não só na Alemanha mas por toda a Europa. A frase acima exemplifica bem o conceito de seleção e substituição de informações, ou seja, a falsificação de dados que contribuem para a perpetuação de um aparato de poder. Tal ação depende muito da intenção e poder já conferido aquele que a determina. A afirmação de uma ideia que foge da verdade exige tal nível de sociopatia em termos ponerogênicos que soa absurdo pensar que toda uma sociedade pode sim ter sua memória apagada a partir da criação de um novo contexto. Essa prática jamais aconteceria nos primórdios da agenda de dominação de um futuro ditador, pois facilmente seria eliminada. É necessário criar todo um contexto de associação a verdadee ao bem comum para após a firmação de sua figura, iniciar a deturpação das informações. As hoje chamadas fake newssão uma das táticas mais emblemáticas da história da antropologia. 

A TCC entra nessa questão a partir da análise de ideias e afirmações do indivíduo, o auxiliando a buscar ou questionar se tais afirmações realmente são baseadas na verdade. Uma vez que o indivíduo seja capaz de saber quem ele é e não se submeter as ações de caráter compulsório, coletivo e corrompido de instituição social seja ela qual for, dificilmente será possível convencê-lo do contrário daquilo que ele sabe em si mesmo que é real. 

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    • 2.9Considerações finais

A principal motivação para elaboração desse projeto se deve a uma frase lida em um comentário de rede social, meses atrás dizendo: “pesquisem sobre ponerologia. Feita a pesquisa, foram encontradas respostas para questões que sempre pautaram inúmeras vezes a sociedade, sobre como mentes tão adoecidas poderiam chegar ao poder. Esse trabalho, não visa dizer qual a ideologia correta ou incorreta, mas sim, identificar nos papéis de líderes e aspirantes a líderes, os comportamentos que podem colapsar toda estrutura de uma sociedade. Somente uma sociedade livre, justa, ética e com um grande braço de apoio psicológico é capaz de ser autônoma no seu direito de pensar, existir, questionar e psicologicamente falando transformar a sua realidade. Que as ameaças partidárias, ideológicas, ponerogênicas e mal-intencionadas nunca recaíam sobre os bons, os livres e principalmente, sobre os corajosos que decidem ser aquilo que escolheram ser. O artigo apresenta algumas das características apresentadas pelos regimes ditatoriais e sobre como as técnicas da TCC podem identificar e mudar ou ​​ evitar o curso da história. 

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3.Biografia(s)

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Yago Cesaroni Nolasco, estudante de psicologia da Universidade Augusto Motta (UNISUAM) no Rio de Janeiro, tem 25 anos de idade e é natural do Rio de Janeiro, RJ. Possui cursos livres de Estoicismo Filosófico aplicado à Psicologia e de Terapia Cognitiva – Comportamental.

 

 

 

 

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Dra. Danielle Castelões Tavares Souza, é Doutora em Educação pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Mestra em Políticas Públicas pela Univerisdade Federal do Rio de Janeiro, Pós-graduanda em Terapia Cognitiva – Comportamental pela PUC – Rio e graduada em Psicologia pela Universidade Estácio de Sá.

 

4.Declaração de direitos

 O(s)/A(s) autor(s)/autora(s) declara(m) ser detentores dos direitos autorais da presente obra, que o artigo não foi publicado anteriormente e que não está sendo considerado por outra(o) Revista/Journal. Declara(m) que as imagens e textos publicados são de responsabilidade do(s) autor(s), e não possuem direitos autorais reservados à terceiros. Textos e/ou imagens de terceiros são devidamente citados ou devidamente autorizados com concessão de direitos para publicação quando necessário. Declara(m) respeitar os direitos de terceiros e de Instituições públicas e privadas. Declara(m) não cometer plágio ou auto plágio e não ter considerado/gerado conteúdos falsos e que a obra é original e de responsabilidade dos autores.

 

5.Referências

  • Lobaczewski, andrzej. Ponerologia: Psicopatas no poder. Ítaca ed. São Paulo: Vide editorial, 2014.;

  • Association, American Psychiatric: Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders. Artmed, 5th Edition Porto Alegre 2013.;

  • Dutton, Kevin: A sabedoria dos psicopatas. Record; 1ª edição 26 março 2018.;

  • Peterson, Jordan B. Além da Ordem: Mais 12 regras para a vida / Jordan B. Peterson; traduzido Wendy Campos. - Rio de Janeiro: Alta Books, 2021.;

  • Viggiano, Giuliana:quem foi charles manson o lider da seita que aterrorizou os eua em 1969. Revista Galileu. 7/2019.;

  • Lucas ,George : Star Wars – A Vingança do Sith,. Filme. EUA: Lucasfilm, 2005.;

  • Lucas ,George :Star Wars – A Ameaça Fantasma,. Filme. EUA: Lucasfilm,  1999.;

  • Lucas ,George: Star Wars – O Ataque dos Clones,. Filme. EUA: Lucasfilm,  2002.;

  • BECK, Judith S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. Artmed 2, p 413 Porto Alegre:, 2013.;

  • Bakunin, Mikhail . Obras completas. D. A. de Santillán, trad., Vols. 1-3. Madrid: La Piqueta. (1977).

     

 

1

CIPPE, Rio de Janeiro, Brasil.

2

CIPPE, Rio de Janeiro, Brasil.

 


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