Compartilhar:

Artigo - PDF

 

Scientific Society Journal  ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​ ​​​​ 

ISSN: 2595-8402

Journal DOI: 10.61411/rsc31879

REVISTA SOCIEDADE CIENTÍFICA, VOLUME 7, NÚMERO 1, ANO 2024
.

 

 

ARTIGO CURTO ORIGINAL

Entropia em sistemas vivos: uma proposta de ensino de Física não tradicional

Tiago Martins Moura1, Cristiane de Carvalho Ferreira Lima Moura2

 

Como Citar:

MOURA, Tiago Martins; MOURA, Cristiane de Carvalho Ferreira Lima. Entropia em sistemas vivos: uma proposta de ensino de Física não tradicional. Revista Sociedade Científica, vol.7, n. 1, p.3522-3528, 2024.

​​ https://doi.org/10.61411/rsc202470117

 

DOI: 10.61411/rsc202470117

 

Área do conhecimento: Ensino de Física.

.

Sub-área: Ensino de Ciências.

.

Palavras-chaves: Entropia em sistemas vivos; Ensino de Física não tradicional; Ensino médio.

 

Publicado: 13 de agosto de 2024.

Resumo

Freire (1987) discorre sobre a necessidade de um ensino contextualizado e real que possa ser internalizado e, quando possível, utilizado em prol da sociedade. O conceito de entropia talvez seja um dos mais abstratos da Física, mas vital ao desenvolvimento da vida e da ciência. Visto essa necessidade, este artigo tem o objetivo de materializar uma proposta de ensino de Física não tradicional para a temática entropia em sistemas vivos para docentes aplicarem a discentes do ensino médio. Para tanto, utiliza-se de metodologia de natureza qualitativa, baseada em pesquisa bibliográfica. O referencial teórico constitui-se na proposição de situações problemáticas abertas que os alunos possam considerar de interesse, conforme Gil-Pérez (1993) e o livro "What Is Life? & Mind and Matter" (O que é a vida? O aspecto físico da célula viva) de Schrödinger (1944). Espera-se que esta proposta contribua para minimizar as dificuldades tanto no processo de ensino docente quanto no de aprendizagem discente, possibilitando novas perspectivas de ambos sobre a temática abordada, oportunizando um ensino de Física mais colaborativo, integrador, reflexivo de modo a viabilizar o desenvolvimento de competências e habilidades conforme preconizado na Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

 

 

.

1.Introdução

O ensino de Ciências há tempo enfrenta desafios de transposição didática1 de conceitos complexos em propostas de aprendizagens mais tangíveis. Muito se defende a importância do ensino que não apenas transmita conhecimentos, mas contextualizado e relevante, permitindo que alunos o internalizem e utilizem em prol da sociedade2. Essa ideia é crucial para a abordagem de temas abstratos e complexos que parecem distantes da realidade dos estudantes, como a entropia, que desempenha um papel fundamental na compreensão dos processos naturais, biológicos e tecnológicos. 

A entropia relaciona energia e sua capacidade de realização de trabalho, bem como o grau de desordem do sistema que reflete na irreversibilidade dos processos naturais (Segunda Lei da Termodinâmica), espontaneidade das reações químicas, eficiência de motores térmicos e a transferência de energia em sistemas biológicos3. Analiticamente, para sistemas termodinâmicos isolados, a variação da entropia clássica pode ser expressa por: ΔS = Q/T (1), onde Q é a quantidade de calor transferido e T a temperatura em Kelvin do sistema4. Já a entropia estatística é definida em termos do número de microestados que correspondem a um dado macroestado do sistema e pode ser expressa por: S = kB.​lnΩ (2), onde kB é a constante de Boltzmann e Ω é o número de microestados possíveis5.

.

2.Referencial teórico

O principal referencial teórico utilizado para alcançar o objetivo deste artigo é o livro intitulado: “What Is Life? & Mind and Matter” escrito pelo autor Erwin Schrödinger6, ganhador do Nobel de Física de 1933, um dos desenvolvedores da mecânica quântica. Somado a este referencial, utiliza-se a metodologia de proposição de situações problemáticas abertas que os alunos possam considerar de interesse com a criação de contextos de ensino que apresentem problemas reais ou simulados7. Essa abordagem incentiva a investigação e a reflexão crítica, permitindo que os alunos explorem e desenvolvam suas próprias soluções. São situações planejadas para serem relevantes e interessantes ao público, estimulando o pensamento independente e a aplicação de conceitos em contextos práticos, possibilitando promover aprendizagem ativo e engajadora, contribuindo para desenvolver competência e habilidades mais profundas e contextualizadas do conteúdo8.

 

3.Metodologia

Trata-se de uma metodologia de natureza qualitativa, baseada em pesquisa bibliográfica na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e do livro já citado, conforme apresentado na próxima seção. Foi inicialmente feita, de 09 a 11 de abril de 2024, uma pesquisa na BDTD, na caixa de busca, utilizando a expressão “entropia em seres vivos”, para todos os campos das dissertações e teses, que trouxe apenas 12 resultados. Em seguida, foi feita uma leitura dos títulos, resumos e objetivos destes trabalhos. Como primeiro filtro, foram buscadas apenas as Teses e Dissertações (DTs) que tratam de entropia em seres vivos para o ensino de Física. Aplicado esse filtro nos 12 corpus iniciais, retornou apenas um resultado; a dissertação intitulada Física para uma alimentação saudável da autora Fernanda Cavaliere Ribeiro Sodré. Tendo em vista esse resultado, é desnecessário aplicar outros filtros, pois isso justifica a necessidade do objetivo deste artigo, pela metodologia de apresentação, leitura reflexiva dialogada e proposição de situação de aprendizagem a partir dos trechos a serem trabalhados do referido livro.

.

4.Desenvolvimento da proposta

Visto a necessidade urgente do desenvolvimento de matérias na temática, essa proposta de ensino de Física não tradicional para entropia em sistemas vivos é desenvolvida em até três aulas e tem início com a apresentação do livro “What Is Life? & Mind and Matter” e seu autor para alunos da segunda série do ensino médio. Feito isso, é informado à turma que serão utilizados apenas quatro trechos do sexto capítulo — Ordem, desordem e entropia, mas é orientado a ler todo o capítulo a fim de maior contextualização. Para tanto, o livro em português é disponibilizado em drive e entregue impresso, antecipadamente à primeira aula, os trechos a serem trabalhados.

Antes de iniciar a leitura, faz-se necessário realizar um diálogo livre com a turma para mapear (espécie de pré-teste) seus conhecimentos prévios sobre as leis da termodinâmica. Verificado que a turma possui os conhecimentos prévios necessários, pode-se dar continuidade projetando na lousa situação problemática aberta7, segue abaixo, para problematizar a afirmação de que a entropia sempre tende a aumentar.

“Seres orgânicos, ao se desenvolverem, criam estruturas mais organizadas. Imagine o processo de fecundação humana ou desenvolvimento de um fruto. Ao acompanhar essas evoluções, é vista a formação de sofisticadas estruturas (mais organizadas) que mais tarde passarão a se degradar, levando-o à morte. Agora, como explicar isso em termos da entropia?”

A situação problemática permite refletir a afirmação totalitária de que a entropia sempre tende a aumentar (a desordem), mas, acima, até certo ponto, mostra o oposto. Assim, o professor deve explicar que a entropia em sistemas vivos (não isolados e em desequilíbrio térmico) implica outras relações, por exemplo, com a Biologia e Química, além da Física e promover uma reflexão neste viés. Em seguida, é projetado na lousa os quatro trechos do livro para leitura compartilhada reflexiva e dialogada.

“Quando um sistema não vivo é isolado ou colocado em um ambiente uniforme, usualmente todo o movimento cessa depressa... É atingido um estado permanente, no qual não ocorre nenhum evento observável. O físico dá a esse estado o nome de equilíbrio termodinâmico ou estado de “entropia máxima” ... Como um organismo vivo evita o decaimento? A resposta óbvia é: comendo, bebendo, respirando e (no caso das plantas) assimilando. O termo técnico é metabolismo...quer dizer troca ou câmbio...”.

Deste trecho, pode-se propor situações a discutir relações para corroborar a afirmação do autor de que estado de equilíbrio térmico é sinônimo de entropia máxima. Para isso, utilizam-se as relações entre η, T, W e S mostrando que ao chegar ao equilíbrio térmico, não haverá mais como realizar trabalho, pois não há diferença nas temperaturas, não há mais colar em trânsito (energia) e seu rendimento seria zero e a entropia máxima.

“O que é então esse algo tão precioso contido em nosso alimento, e que nos livra da morte?... tudo o que acontece na Natureza significa um aumento da entropia da parte do mundo onde acontece. Assim, um organismo vivo aumenta continuamente sua entropia ... e, assim, tende a se aproximar do perigoso estado de entropia máxima, que é a morte. Só posso me manter distante disso, isto é, vivo, através de um processo contínuo de extrair entropia negativa do ambiente...se alimentar... de entropia negativa...

Aqui deve ser proposto situações que levem à conclusão de que a entropia em nosso corpo está constantemente aumentando nos levando à morte. Para evitá-la, nos alimentamos, significa consumir entropia negativa que vem dos alimentos que evoluíram de uma unidade menor para estruturas mais organizadas - baixa entropia. Pode-se explicar isso pensando em termos de balanço energético, pois há um momento que não se consegue diminuir nossa entropia e chegamos à morte; a matéria do nosso corpo será fonte de entropia negativa para o ambiente, fechando assim o ciclo do balanço energético.

“Como poderíamos expressar em termos da teoria estatística a maravilhosa faculdade do organismo vivo, pela qual ele atrasa o decaimento no equilíbrio termodinâmico (morte)?...Ele se alimenta de entropia negativa, como se atraísse um fluxo de entropia negativa para si mesmo, afim de compensar o aumento de entropia que produz por viver e, assim, manter-se em um nível de entropia estacionário e bem baixo. Se D é uma medida de desordem, sua recíproca, 1/D, pode ser considerada uma medida direta de ordem. Já que o logaritmo de 1/D é apenas o negativo do logaritmo de D, podemos escrever a equação de Boltzmann como: - (entropia)= k log(1/D).

Com isso, o professor reforçará outros exemplos a ideia da entropia negativa dos sistemas vivos, trazendo e comparando com a equação de entropia conforme Boltzmann.

...a expressão “entropia negativa” pode ser substituída por uma melhor: entropia, tomada com o sinal negativo, é ela mesma uma medida de ordem. Assim, a forma pela qual um organismo se mantém estacionário em um nível razoavelmente alto de ordem (= nível razoavelmente baixo de entropia) realmente consiste em absorver ordem de seu meio ambiente... Depois de utilizá-lo, devolvem-no em uma forma muito degradada… todavia, pois plantas ainda podem usá-lo. (Estas, é claro, têm na luz solar seu fornecimento mais potente de “entropia negativa”).

Neste último trecho o professor deve fazer um fechamento e síntese da ideia que Schrödinger, traz de entropia negativa produzida pelos sistemas vivos, bem como responder à situação problemática aberta inicial e ainda exemplificar que processo semelhante pode ocorre na formação de estrelas a partir da poeira cósmica. Relembrar também aos alunos que em aulas passadas foi visto irrevogavelmente que a entropia sempre tende a aumentar e que tal afirmação ainda é válida para sistemas isolados em equilíbrio térmico e que a ideia de entropia negativa não rompe a lei de conservação da energia e concluir a aula com a elaboração de um mapa conceitual9.

.

5.Considerações finais

Nesta proposta de ensino de Física é possível verificar a utilização de abordagem contemporânea baseada na proposição de situações problemáticas abertas de interesse dos alunos em paralelo com a leitura dialogada e reflexiva dos trechos em questão do livro de referência. Esta metodologia conjunta possibilita um ambiente mais profícuo de ensino que torna os discentes sujeito participe deste processo possibilitando-os perceber conceito inicialmente abstrato em sua vida. Aos docentes, oportuniza a implementação da metodologia de estratégia didática mais tangível a compreensão dos alunos os engajando no processo de aprendizagem viabilizando o desenvolvimento de habilidade e competências para êxito além nas componentes curriculares, mas como cidadão mais consistentes.

.

6.Declaração de direitos

O(s)/A(s) autor(s)/autora(s) declara(m) ser detentores dos direitos autorais da presente obra, que o artigo não foi publicado anteriormente e que não está sendo considerado por outra(o) Revista/Journal. Declara(m) que as imagens e textos publicados são de responsabilidade do(s) autor(s), e não possuem direitos autorais reservados à terceiros. Textos e/ou imagens de terceiros são devidamente citados ou devidamente autorizados com concessão de direitos para publicação quando necessário. Declara(m) respeitar os direitos de terceiros e de Instituições públicas e privadas. Declara(m) não cometer plágio ou auto plágio e não ter considerado/gerado conteúdos falsos e que a obra é original e de responsabilidade dos autores.

.

7.Referências

  • CHEVALLARD, Yves. La Transposition Didactique: Du savoir savant au savoir enseigné. Grenoble: La Pensée Sauvage, 1985.

  • Freire, P. (1987). Pedagogia do oprimido. Paz e Terra.

  • Tipler, P. A., & Mosca, G. (2000). Physics for Scientists and Engineers (4th ed.). W.H. Freeman and Company.

  • Nernst, W. (1907). Experimental and Theoretical Applications of Thermodynamics to Chemistry. Berichte der Deutschen Chemischen Gesellschaft.

  • Boltzmann, L. (1896). Lectures on Gas Theory. Berkeley: University of California Press.

  • Schrödinger, E. (1944). What Is Life? & Mind and Matter. Cambridge University Press.

  • GIL PEREZ, D. Contribución de la Historia y de la Filosofía de las ciencias al desarrollo de un modelo de enseñanza /aprendizaje como investigación. Enseñaza de la Ciencias,1993, 11(2), 197-212.

  • Base Nacional Comum Curricular (BNCC). (2018). Ministério da Educação, Brasil.

  • AUSUBEL, David P. Psicologia educacional. Rio de Janeiro: Interamericana, 1985.

 

     

1

Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Mossoró, Brasil.

2

Universidade Federal Rural do Semi-Árido, Mossoró, Brasil.


Compartilhar: