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ISSN: 2595-8402

Journal DOI: 10.61411/rsc31879

REVISTA SOCIEDADE CIENTÍFICA, VOLUME 7, NÚMERO 1, ANO 2024
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ARTIGO ORIGINAL

O Atendimento Educacional Especializado (AEE) na perspectiva da escola pública

Rafael Backes1

 

Como Citar:

BACKES, Rafael. O Atendimento Educacional ​​ Especializado (AEE) na perspectiva da escola pública. Revista Sociedade Científica, vol.7, n. 1, p.2461-2475, 2024.

https://doi.org/10.61411/rsc202447217

 

DOI: 10.61411/rsc202447217

 

Área do conhecimento: Educação.

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Sub-área: Educação inclusiva.

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Palavras-chaves: Atendimento educacional especializado. Sala de recursos multifuncionais. Escola pública

 

Publicado: 31 de maio de 2024.

Resumo

Este estudo busca problematizar algumas questões sobre o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na perspectiva da escola pública e das políticas para o atendimento de estudantes na rede pública de ensino regular. Para tanto inicialmente buscamos definir o significado dos termos Atendimento Educacional Especializado (AEE) e Sala de Recursos Multifuncionais (SRM), bem como o que a legislação preconiza sobre tais nomenclaturas, e posteriormente apresenta-se um panorama sucinto do que vem sendo estudado a nível dos programas de pós-graduação brasileiros, por meio de uma pesquisa bibliográfica no Banco de Teses e Dissertações da Capes no período compreendido entre 2013 a 2017, que parfaz quatro dissertações e uma tese, sendo duas no campo de estudos da Psicologia e três na área educacional. Com base nos materiais analisados concluiu-se que os estudos sobre a temática em tela abarcam desde questões relacionadas a inclusão de fato nas escolas, mas também como se dá a relação entre os sujeitos envolvidos neste processo, muitas vezes influenciados por questões médicas ou curriculares, como dispositivos de controle do aluno deficiente. No tocante a efetivação das politicas de atendimento nesta esfera, nota-se um avanço pouco expressivo, mas que aponta indícios de que a inclusão pode e deve ser a maneira mais democrática de realização de políticas voltadas ao sujeito deficiente e sua inserção na escola pública.

 

 

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1.Introdução

Antes de definirmos o que é o Atendimento Educacional Especializado (AEE) ou Sala de Recursos Multifuncionais é necessário pontuarmos algumas concepções sobre como a deficiência tornou-se um assunto tão urgente no meio educativo e qual a relação desta com este espaço, em especial na escola pública. Compreender como este conceito evolui ao longo do processo histórico nos permite pontuar avanços e limitações com relação ao acesso a uma educação que valorize as diferenças e também o processo de desenvolvimento de cada indivíduo. Também não se pode esquecer que estas discussões abriram (e ainda o fazem) espaços de discussão nos mais diversos meios como por exemplo na cidadania, trabalho, esporte e direitos humanos. Silva (13) pontua algumas considerações neste sentido:

A história das pessoas com deficiência remete-nos à história do homem, da cultura e da sociedade. A palavra deficiente está apenas qualificando um ser humano, atribuindo a ele uma característica. O então ser humano caracterizado, pertencente a uma história e a um processo de construção social, antes de “ser deficiente” é uma pessoa. (SILVA, 13).

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A autora nos traz a ideia de que antes de ser deficiente, o ser humano é uma pessoa viva, um ser biológico como todos nós o somos, inseridos numa cultura e numa sociedade, que tem desejos, que pensa e sente, e que tem um contexto social.

Fontes (11) traz a concepção de deficiência sob o viés da Psicologia, na concepção histórico-cultural, ao afirmar que a mesma por si só não define o sujeito socialmente, mas sim uma pessoa, pois não tem um efeito direto mas indireto. Ainda afirma que deficiência é uma característica que desconstrói, surpreende, desorganiza e imobiliza diante do considerado normal pela sociedade, e que a criança deficiente é entendida como portadora de um desvio social.

Considerando a concepção de deficiência na história, no período pré-histórico as comunidades viviam basicamente de atividades simples como a caça e a pesca, por exemplo, e necessitavam de locomoção e por ser uma questão de sobrevivência, essencialmente nômades. Quem não fosse capaz destas habilidades era simplesmente abandonado pelo grande grupo.

Assim, na medida em que as sociedades foram modificando suas formas de agrupamentos e interações, vieram transformações de origem social, passando de grupos nômades para sociedades organizadas, e em consequência a necessidade de regras de organização, por meio das leis, acordos e crenças. Indo mais além na linha do tempo, no período histórico clássico, representado pelas sociedades grega e romana, altamente militarizada e de economia agrária. Neste período e nesta sociedade predominava a crença em mitos como uma forma de entender as relações mundanas e sociais. Ainda na Grécia antiga, destacam-se a cidade de Esparta, predominantemente militar, onde os homens para serem aceitos como soldados, deveriam ter o corpo perfeito, pois esta “perfeição e vigor” lhe dariam condições de sobrevivência. Neste aspecto Silva apud Makouhl (13) aponta que:

[...] até o final desse período grego o abandono ou extermínio acontecia sempre que a deficiência implicasse dependência econômica ou incapacidade para o trabalho, ou seja, sempre que essas pessoas não conseguissem atender às suas necessidades básicas de sobrevivência.

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Ainda apesar da diferença social e cultural entre o período antigo relatado anteriormente e a sociedade atual, a autora ainda faz uma colocação pontual, onde refere como se problematiza a inclusão de alunos com deficiência na escola:

Apesar de toda dessemelhança entre períodos históricos e culturais distintos, tal concepção pode, em algumas situações, guardar semelhança com situações observadas nas escolas atuais quando os professores reclamam de terem matriculado em suas salas de aula alunos com necessidades educacionais especiais. De forma semelhante acontece quando os gestores administrativos não liberam ou não investem recursos para contratação de professores de AEE, aquisição de recursos específicos e construção de salas de multirrecursos nas escolas para atender esses alunos.

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Já na Idade Moderna, a concepção de deficiência muda, pois com o declínio do Império Romano neste período em contrapartida surge a Igreja Católica, detentora única de fonte da educação e cultura na sociedade. Em virtude disso surgem os mosteiros e as universidades, e a questão sobre deficiência passou a ser vista como uma relação corpo e alma, a deficiência era vista em sentido dúbio, ora como sendo algo anormal, ora como sendo predestinação

Avançando historicamente e focando no Brasil, entre os séculos XVII e XVIII as pessoas deficientes eram abandonadas à própria sorte, e, somente ao final deste período começam a ser acolhidas por instituições de caridade. Já no século XIX esta concepção passa a apresentar mudanças significativas, pois no período imperial cria-se duas instituições para o atendimento de deficientes, no entanto devido a precarização no oferecimento desse serviço era notório o descaso. Ainda neste período as instituições atendiam de forma notória somente deficientes visuais e auditivos. Com relação aos deficientes mentais a autora faz uma observação:

Devido a predominância do meio de vida na zona rural, as pessoas com deficiência mental não eram facilmente identificadas por, em certa medida, conseguirem desempenhar as atividades exigidas por aquele meio, estando assim adaptadas e, de certo modo, sendo consideradas produtivas. Dessa forma, não havia interesse por parte do estado em investir e despender recursos destinados a essa população. (SILVA, 2016, p.28).

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Com relação ao exposto acima, acerca de uma retrospectiva histórica, embora sucinta sobre a inclusão escolar e deficiência no Brasil e no mundo, temos condições de caracterizar e conceituar com base na legislação o que se entende por Atendimento Educacional Especializado (AEE) e Sala de Recursos Multifuncionais (SRM). O AEE foi criado visando a dar um suporte a alunos com necessidades educativas especiais, de modo a facilitar seu acesso ao currículo, devendo ser ofertado, prioritariamente, na sala de recursos multifuncionais da própria escola ou em outra escola de ensino regular, podendo ser realizado, também, em centro de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, conveniadas com a Secretaria de Educação ou órgão equivalente dos Estados, Distrito Federal ou dos Municípios ofertados (BRASIL, 7).

As Salas de Recursos Multifuncionais foram concebidas como um programa do Ministério da Educação (MEC) com objetivo de fornecer suporte para o AEE na escola pública regular com o objetivo é apoiar os sistemas de ensino na implantação de salas com materiais pedagógicos e de acessibilidade, para a realização do atendimento educacional especializado. No âmbito de ingresso na escola, a matrícula no AEE, realizado em Sala de Recursos Multifuncionais será efetivada para os alunos público-alvo da Educação Especial que estejam matriculados em classes comuns da própria escola e alunos de outra(s) escola(s) de ensino regular, conforme a demanda, sendo necessário inserir o registro das matrículas no Censo Escolar da escola.

 

2.O que os estudos nos apontam sobre AEE e SRM na escola pública

Diante da retrospectiva histórica sobre deficiência e como se relacionou na escola de acordo com as concepções de educação “normal” é de extrema importância nos atentarmos ao panorama científico no tocante ao que as pesquisas recentes sinalizam sobre o Atendimento Educacional Especializado (AEE) e Sala de Recursos Multifuncionais (SRM) bem como as dinâmicas relacionais sobre estas duas concepções base dentro das políticas e ações inclusivas no espaço educativo e, em especial, na rede de ensino pública.

Para tanto, com base na pesquisa bibliográfica em periódicos (teses e dissertações) no repositório digital da Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) foram encontradas seis produções, que perfazem uma tese e cinco dissertações, todas relacionando a expressão ou palavra “inclusão”, “atendimento educacional especializado na escola pública”, “sala de recursos multifuncionais”.

Christofari (10) analisa, por meio dos registros escolares de alunos que frequentavam um serviço de Atendimento Educacional Especializado, os discursos que constituem estes em seus modos de aprender e de ser no contexto escolar, com enfoque qualitativo, por meio de pesquisa bibliográfica, e como campo de pesquisa escolas da rede municipal de ensino de Porto Alegre entre 2010 e 2013.

Como principais achados a autora percebeu que há uma produção discursiva que prioriza as condutas dos alunos como principal desafio, sendo estas consideradas como principal barreira ao processo de aprendizagem, sendo que tais dificuldades de aprendizagem apresentam como principais fatores a hereditariedade e dinâmica familiar do sujeito. No entanto os achados permitiram concluir que também existem discursos que romperam com a lógica da padronização e classificação, compreendendo tanto discursos de profissionais da saúde quanto da educação, fortalecendo a instituição escolar como um espaço de contexto dinâmico. Tais discursos colocam a escola como produtora de modos de ser aluno, com reconhecimento de processos de transformações:

Muitos são os discursos que se articulam na constituição da categoria de aluno anormal, discursos que se atualizam nas práticas pedagógicas, nas práticas médicas, nas práticas do contexto familiar. E, nesse sentido, é necessário indagar quais os tipos de discursos a escola produz, acolhe e faz funcionar como verdadeiros. (CHRISTOFARI, 10).

Percebe-se nas falas anteriores que a escola, dentro do processo de escolarização é um mecanismo importante na construção das práticas e da subjetivação dos modos de ser dos alunos e das práticas escolares em si, e, quando se trata de alunos deficientes, a questão é ainda mais delicada, visto que por trás deste aluno há um contexto social e familiar e, algumas vezes este contexto não é favorável ao desenvolvimento e inclusão deste aluno na escola:

A medicalização é um dispositivo e como tal é uma formação, um modo específico, historicamente datado, de relações entre o poder e os saberes. Nesse sentido, entender os efeitos do dispositivo de medicalização é compreender que não há possibilidade de uniformidade desse fenômeno. (CHRISTOFARI, 10).

O enfoque da autora acima permeia as questões referentes a medicalização como um dispositivo de construção de uma cultura de saber e poder na perspectiva dos estudos de Foucalt, que considera o sujeito um produto do meio e que é diretamente influenciado pelo mesmo. No contexto do seu trabalho abordou o viés escolar e particularmente as questões relativas aos alunos deficientes.

Aproximando-se da produção de Christofari (10) no tocante as questões referentes a medicalização, a dissertação de Belusso (2) teve como objetivo de pesquisa evidenciar os saberes presentes nos registros escolares de alunos que frequentavam o Atendimento Educacional Especializado (AEE) por meio de um quadro teórico com alguns entendimentos sobre os conceitos de poder e saber e o funcionamento da inclusão escolar na legislação e, como método investigativo a cartografia como inspiração, definindo-se duas pistas/instrumentos, que consistiram: no caderno de anotações e dos registros escolares normativos ancorada no modelo de Foucault.

Partindo destes registros, foi possível identificar vestígios de saberes psicológicos e médicos, os quais foram denominados noções de um saber psicológico e noções de um saber médico e, com base nos registros dos dois instrumentos de pesquisa evidenciou-se três saberes que se fizeram constantemente presentes, que se interrelacionam permanentemente. Entretanto, um deles - o saber curricular de um currículo adaptado (representado pelo caderno de anotações), para poder funcionar, precisa de outros dois – as noções de um saber psicológico e as noções de um saber médico.

O Currículo Adaptado torna-se um artefato da maquinaria escolar, engendrada em relações de poder –saber escolar, que põem em funcionamento estratégias de normalização e fabricação de um determinado indivíduo, tornando-o, assim, um produto dos procedimentos disciplinares. ​​ Dessa forma, entendo que a instituição escolar, mesmo diante das reformas propostas pelas políticas inclusivas, continua funcionando como uma máquina que visa à produção de um determinado indivíduo baseada em saberes científicos, pois é a partir desses, associados a certos aparatos e mecanismos disciplinares, que se torna possível um conhecimento minucioso do indivíduo. Esse conhecimento é que permitirá a criação de determinadas práticas e estratégias que possibilitam sua normalização. (BELUSSO, 2)

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Considerando a instituição escolar pesquisada com base nas premissas do trabalho, a autora conclui que ainda a escola é um instituição que se utiliza da vigilância e acúmulo de registros escritos como forma de controle sobre o aluno por instrumentos observáveis e mensuráveis e o professor, baseado neste conjunto de informações desenvolve um poder e um saber com relação ao processo de aprendizagem do aluno, de forma classificatória e de diferenciação. Por outro lado quando se toma por base a dinâmica de atendimento do AEE na escola investigada, a mesma rompe com o que a legislação preconiza acerca da políticas de atendimento dos alunos com deficiência, pois com base nas noções de um saber médico ou psicológico constrói um currículo adaptado para cada aluno atendido pelo AEE:

A escola parece subverter o que está posto na legislação sobre adaptações curriculares, pois ela produz um documento denominado Currículo Adaptado que tem a estrutura de um planejamento, tendo por base dois saberes, o médico e o psicológico. (BELUSSO, 2).

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Sobre a relação da escola com o saber médico, Belusso (2) afirma que a escola se apropria dos discursos médicos com relação ao aluno deficiente e, nesta perspectiva a escola intervém como um mecanismo de controle sobre a deficiência:

[...] quero dizer que a instituição escolar introduz e apropria-se do diagnóstico médico de forma que esse determina se o indivíduo necessitará ou não da produção do Currículo Adaptado. Caso o indivíduo necessite da produção do Currículo, o professor fará uso dos saberes do campo da Psicologia sobre o desenvolvimento humano e a psicopatologia para enquadrar o aluno na etapa e nos problemas de desenvolvimento. A partir dessa postura clínico-avaliadora, o professor poderá delimitar os objetivos, as habilidades e estratégias do Currículo Adaptado que serão trabalhadas com o aluno com necessidades educativas especiais. ​​ (BELUSSO, 2)

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Já o trabalho de Silva (13) investigou a legislação brasileira acerca da inclusão a fim de verificar qual é o papel do psicólogo (escolar) proposto na legislação, permeado pelas relações entre Psicologia, Educação e Psicologia Escolar. Por meio da ​​ pesquisa qualitativa, bibliográfica e documental, realizou uma revisão de literatura a fim de apreender a relação sociedade e pessoas com deficiência ao longo do tempo, e como orientação teórica o conceito de formação cultural da Teoria Crítica da Sociedade da Escola de Frankfurt e uma revisão da legislação brasileira sobre pessoas com deficiência, tendo como ênfase a relação delas com a educação e como ponto de partida a Declaração de Salamanca.

Como resultados, de acordo com a legislação vigente, o profissional de Psicologia não tem vínculo com o Atendimento Educacional Especializado, mas é incumbido de acompanhar alunos com necessidades educacionais especiais. Ressalta-se que a figura do psicólogo não é contemplada nos dispositivos legais acerca da Educação no nível federal. O psicólogo escolar só vai aparecer nas legislações estaduais e municipais. A Psicologia, ou termos afins, é referida de três formas na legislação vigente sobre pessoas com deficiência: avaliação da deficiência, tratamento psicológico e para conceituar violência.

Silva (13) evidencia o entrave das questões referentes a formação e atuação profissional de Psicologia, e, mais atentamente, do psicólogo educacional com o AEE: o imediatismo capitalista como impossibilidade de realizar um atendimento pontual aos sujeitos do AEE na esfera educativa:

A psicologia tem possibilidade de contribuir com o AEE, como de fato já vem ocorrendo. Todavia, seria importante o psicólogo escolar ser reconhecido nas leis que regem os espaços educacionais em todos os seus níveis, assim como fonoaudiólogos e assistentes sociais, entre outros profissionais requeridos, tendo em vista o processo de inclusão e formação. O não reconhecimento legal do psicólogo escolar com as suas funções específicas impossibilita que ele tenha um lócus de atuação definido. Essa definição é essencial porque abre precedentes importantes como a descrição de cargos e abertura de concursos. O profissional, com isso, tem a possibilidade de ter, de forma clara, as suas atribuições e, com isso, será capaz de refletir sobre sua prática e estabelecer relação dessa prática com os processos de formação cultural, inclusão e, em específico, com o AEE. (SILVA, 13)

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Estas duas produções são pontuais em seu campo de pesquisa: a primeira problematiza a questão da medicalização como dispositivo de construção social do sujeito deficiente como um modo de ser na escola pública e como os professores e equipe pedagógica intervém na construção e escolarização deste aluno deficiente, concluindo que tais práticas escolares quando associadas à medicina ou sob o entendimento psicológico influenciam de maneira forte a inclusão escolar do aluno deficiente. A segunda contribuição assinala a relação da Psicologia como campo de conhecimento que contribui na assistência aos sujeitos do AEE, no entanto o respaldo na legislação bem como questões de ordem profissional influenciam o trabalho do psicólogo escolar.

Fontes (11) problematiza como está se processando a implantação do Programa de Implantação das Salas de Recursos Multifuncionais, proposta desenvolvida pelo governo para subsidiar o AEE nas escolas regulares, por meio do estudo de caso, conduzido pela Psicologia Histórico-Cultural, mais especificamente os estudos de Vigotsky, e, como instituição pesquisada uma escola de Ensino Regular da rede estadual de ensino, que ofertasse tal atendimento em um período superior a cinco anos.

Como instrumentos de análise a autora valeu-se de de observações na instituição escolar e do AEE por meio de diário de campo, análise documental de legislações federais, estaduais e da SRM, e entrevistas gravadas em áudio com a professora de AEE, professores de ensino regular com alunos matriculados no AEE, bem como gestores e técnicos da primeira escola e de duas outras escolas que têm seus alunos atendido na mesma SRM, além de observação participante, e também buscando elementos acerca da formação docente inicial e continuada na área de Educação Especial, bem como a maneira como acontece o ingresso no AEE, o cotidiano do serviço e as relações com o ensino regular.

Como resultados salientou-se que a inclusão vem acontecendo, tendo aspectos institucionais favoráveis, porém não sem desafios práticos e tensionamentos, muitos deles devido à precariedade das condições de implementação da inclusão, carência de apoio técnico, e dificuldades na gestão dos recursos disponíveis pela rede estadual disponibilizados às escolas. Sobre a questão da deficiência em si Fontes (11) assinala:

A deficiência passa a ser colocada como uma “barreira” a qual as impedem de acessar as outras pessoas, independente de classe social ou faixa etária, por não se ter trabalhado objetivamente com a suplantação de tais barreiras, restringindo-se apenas as adequações físicas nos prédios públicos e privados, também efetuadas em forma da “lei”, e não em forma de fato, em se colocar no lugar do outro, o que contribuiria positivamente para a superação dos obstáculos. (FONTES, 11)

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Almeida (1) investigou as possibilidades, os desafios e limites postos a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas públicas do município de Niterói/RJ por meio do atendimento educacional especializado/AEE realizado nas salas de recursos multifuncionais/SRMs. Como referencial teórico e metodológico a dissertação fundamentou-se na teoria de Theodor Adorno, pensador da Teoria Crítica da Sociedade.

Os resultados apontaram que o município de Niterói/RJ e seus profissionais têm contribuído para que a inclusão seja possível, considerando as contradições e limites sociais impostos pela organização da sociedade de classes; a capacidade de resistência à educação reduzida à adaptação e à dominação cultural na sociedade de classes na formação para a heteronomia. Portanto, os aspectos analisados revelaram os avanços da educação inclusiva no município de Niterói/RJ.

Apesar do foco da autora acima ser em específico no local onde reside, percebe-se que o AEE por meio da SRM vêm respondendo em parte as demandas educativas, seja por meio de políticas educativas adequadas, seja pela articulação com profissionais de outras áreas. No entanto muitas outras problematizações precisam ser feitas sobre o tema em estudo.

O trabalho de Milena Lins Fernandes Soares(12), intitulado “Inclusão escolar e Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB): um estudo de caso”, de 2013, defendida pela Universidade de Brasília, analisa se a educação inclusiva efetiva de alunos público alvo da educação especial em salas comuns do ensino regular poderia influenciar positivamente o IDEB da escola, por meio da identificação de ações realizadas na escola que, motivadas pela inclusão educacional, favoreçe a participação e a aprendizagem de todos os seus alunos, e consequentemente, seu desempenho em avaliações nacionais como do Sistema de Avaliação da Educação Básica - SAEB e seu Índice de Desenvolvimento da Educação - IDEB que, influenciados positivamente, resultassem na elevação dos índices educacionais.

De natureza qualitativa, modalidade tipo estudo de caso, a pesquisa foi desenvolvida em uma escola pública de ensino regular do Distrito Federal, com observações da rotina escolar e entrevistas com equipe diretiva e professores que atendem alunos com deficiência ou Transtorno Global do Desenvolvimento - TGD, além de análise documental. Como resultados, levantaram-se diversos aspectos presentes no Projeto Político Pedagógico da escola e na prática pedagógica docente que influenciam positivamente a aprendizagem dos alunos. Apesar destes aspectos positivos, não foi possível atribuir diretamente o alto índice do IDEB da escola pesquisada somente à sua prática educacional inclusiva, devido à escola possuir um longo histórico de busca pela melhoria do ensino, mas evidenciou-se que a presença de alunos público alvo da educação especial não impedem a escola oferecer uma educação de qualidade e manter um alto desempenho no IDEB.

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3.Considerações finais

De acordo com o estudo realizado, que consistiu em trazer elementos que refletissem questões sobre o Atendimento Educacional Especializado, bem como da Sala de Recursos Multifuncionais, além de conceituá-los, embora que sucintamente, ​​ este artigo procurou esboçar um quadro investigativo acerca do que foi produzido em nível de pós-graduação, perfazendo teses e dissertações escritas nos últimos cinco anos. De acordo com o que foi levantado nas pesquisas, percebe-se que as questões relativas a problematização da deficiência, bem como implantação de políticas e profissionais que nela atuam, foi possível identificar duas problematizações chave: uma preocupada com a questão assistencial e inclusiva na escola, por meio das SRM e os profissionais envolvidos e de outro a preocupação de discorrer sobre a deficiẽncia, escola e medicamentosa como dispositivos de controle quando associados a escola, que também não foge a regra, enquanto instituição socializadora de conhecimentos.

Dois estudos apontam a escola como um instrumento de controle, vigilância e normatização dos sujeitos considerando as práticas escolares, as vezes aliada às questões médicas como diagnósticos ora como um olhar por meio do entendimento da Psicologia e seu profissional, que ainda não está reconhecido como profissional de suporte dentro das equipes multifuncionais que prestam atendimento aos sujeitos que utilizam o AEE. Um dos estudos chama a atenção pelo fato de relacionar o AEE e seus sujeitos como possíveis influenciadores de qualidade na educação básica, talvez por simplesmente fazerem parte das estatísticas escolares, ou por comprovarem que estão recebendo o direito a educação, que lhes é garantido por lei.

Também diante do que foi encontrado nas produções percebe-se que a Educação Especial como um todo dentro da legislação, no que concerne ao AEE como prática inclusiva conjuntamente com a SRM vêm fornecendo importantes elementos para se pensar a escola e demais instituições parceiras, bem como os pais de alunos a verem o sujeito deficiente como ser humano e como tal, tem o direito de se escolarizar, de conviver com outros em qualquer ambiente e é na escola, que na maioria das vezes conseguirá enxergar com outros olhares o seu mundo como um espaço repleto de possibilidades.

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4. Declaração de direitos

O(s)/A(s) autor(s)/autora(s) declara(m) ser detentores dos direitos autorais da presente obra, que o artigo não foi publicado anteriormente e que não está sendo considerado por outra(o) Revista/Journal. Declara(m) que as imagens e textos publicados são de responsabilidade do(s) autor(s), e não possuem direitos autorais reservados à terceiros. Textos e/ou imagens de terceiros são devidamente citados ou devidamente autorizados com concessão de direitos para publicação quando necessário. Declara(m) respeitar os direitos de terceiros e de Instituições públicas e privadas. Declara(m) não cometer plágio ou auto plágio e não ter considerado/gerado conteúdos falsos e que a obra é original e de responsabilidade dos autores.

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5.Referências

  • ALMEIDA, Elaine Araujo dos Santos Trindade de. Atendimento educacional especializado e educação inclusiva: quais as experiências das salas de recursos multifuncionais nas escolas públicas de Niterói/RJ?. 2013, 157p. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, 2013.

  • BELUSSO, Roniele. Paisagens do atendimento educacional especializado. 2017, 103p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade de Caxias do Sul. Caxias do Sul, 2017.

  • BRASIL. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas especiais. Brasília: CORDE, 1994.

  • BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação: Lei nº 9.394/96 – 24 de dez. 1996.

  • BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Adaptações Curriculares. Brasília: MEC/SEF/SEESP, 1998.

  • BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica. Brasília: MEC/SEESP, 2001.

  • BRASIL. Ministério da Educação. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília, MEC/SEESP, 2008.

  • BRASIL. Decreto n° 7.611, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providências. Brasília, 17 nov. 2011.

  • BRASIL. Orientações para implementação da política de educação especial na perspectiva da educação inclusiva, Brasília, 2015. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.phpoption=com_docman&view=download&alias=17237 secadi-documento-subsidiario-2015&Itemid=30192. Acesso em 18/02/2018.

  • CHRISTOFARI, Ana Carolina. Modos de ser e de aprender na escola: medicalização (in)visível?. 2014. 174p. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014.

  • FONTES, Diana Campos. Atendimento Educacional Especializado: um estudo de caso. 2012. 149p. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Programa de Pós-Graduação em Psicologia , Fundação Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho, Rondônia, 2012.

  • SOARES, Milena Lins Fernandes. 2013, 138p. INclusão escolar e índice de desenvolvimento da educação - IDEB: Um estudo de caso. Dissertação (Mestrado Profissional em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2013.

  • SILVA, Tainá Dal Bosco. 2016, 100p. Psicologia Escolar e Atendimento Educacional Especializado: as conquistas e limitações presentes na legislação. Dissertação (Mestrado em Psicologia). Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2016.

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Universidade Estadual do Rio Grande do Sul-UERGS,Brasil.


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