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ISSN: 2595-8402

Journal DOI: 10.61411/rsc31879

REVISTA SOCIEDADE CIENTÍFICA, VOLUME 7, NÚMERO 1, ANO 2024
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ARTIGO CURTO ORIGINAL

Abdome agudo obstrutivo por Íleo biliar: um relato de caso

Nathália Lima Diniz1; Eduardo Carvalho Horta Barbosa2; Rogério do Carmo Moreira3

 

Como Citar:

DINIZ, Nathália Lima; BARBOSA, Eduardo Carvalho Horta; MOREIRA, Rogério do Carmo. Abdome agudo obstrutivo por íleo biliar: um relato de caso. Revista Sociedade Científica, vol.7, n. 1, p.3256-3261, 2024.

https://doi.org/10.61411/rsc202464817

 

DOI: 10.61411/rsc202464817

 

Área do conhecimento: Ciências Biológicas.

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Sub-área: Microbiologia.

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Palavras-chaves: íleo biliar; abdome agudo obstrutivo; colelitíase.

 

Publicado: 18 de julho de 2024.

Resumo

O íleo biliar é considerado uma causa rara de obstrução do trato gastrointestinal por um cálculo biliar, sendo que a obstrução pode ocorrer do estômago até o reto, mais comumente ocorrendo a nível de intestino delgado¹. Esse processo decorre da formação de fístula entre a vesícula biliar e o trato gastrointestinal. Em mais de 70% dos casos, a fístula acontece em topografia de duodeno, porém pode estar localizada no estômago, jejuno ou colon3. O tratamento padrão-ouro do íleo biliar é cirúrgico e pode ser realizado em uma ou duas etapas, dependendo das condições clínicas do paciente². O caso apresentado discutirá acerca do tratamento realizado para a paciente em questão, além de discutir sobre a suspeição do diagnóstico em pacientes com colecistite recorrente.

 

 

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1.Introdução

O íleo biliar é caracterizado por obstrução intestinal mecânica intraluminal. É considerada uma complicação rara da colelitíase mediante a formação de fistula biliar com o intestino, havendo migração de cálculos e ocasionando obstrução intestinal. Representa de 1 a 4% dos casos de obstrução intestinal mecânica 2,3,6. Geralmente acomete a população feminina, idosos (70- 80 anos) e com múltiplas comorbidades 1,2. ​​ 

Como as manifestações clínicas do íleo biliar não são específicas, há o diagnóstico tardio na maioria dos casos e, consequentemente, alta morbimortalidade 2,4. A clínica depende do sítio de impactação do cálculo, o que justifica os diversos espectros clínicos ².

Paciente, 81 anos, sexo feminino, hipertensa, diabética tipo 2, doente renal crônica, ex tabagista, asmática, com síndrome da apneia obstrutiva do sono, artrite gotosa e colelitíase. Admitida em uma unidade pública de saúde em Brasília em agosto de 2023 com quadro de parada de eliminação de fezes e flatos há 9 dias, associado a dor abdominal difusa, náuseas e vômitos. Submetida a tomografia de abdome com contraste e evidenciada estrutura redonda localizada no interior de segmento ileal, de margem hiperdensa e conteúdo hipodenso, medindo 2,5 x 2,5cm, além de distensão hidroaérea de alças de delgado, pequena quantidade de líquido livre na escavação pélvica e aerobilia.

Devido à falta de equipe de cirurgia geral na unidade de admissão, a paciente foi transferida para o Hospital Regional de Sobradinho. Na admissão, a paciente encontrava-se em regular estado geral, desidratada, com sonda nasogástrica drenando líquido de aspecto biliar. Ao exame físico direcionado, o abdome apresentava-se globoso, sem distensão, com dor a palpação profunda difusamente, massa palpável em região de mesogástrio à esquerda, sem sinais de irritação peritoneal. Os exames laboratoriais evidenciavam leucocitose sem desvio. Como a paciente estava em tratamento clínico sem melhora do quadro, foi indicada abordagem cirúrgica e confirmado o diagnóstico de íleo biliar no intraoperatório.

Achados no intraoperatório: identificado cálculo em íleo, a 70 cm da válvula ileocecal (Figura 1). Realizada a incisão em íleo e a retirada do cálculo identificado. Ao correr alça intestinal, foi localizado um novo cálculo, também em íleo, a 100 cm da válvula ileocecal (não visualizado em tomografia prévia). Realizada ordenha de cálculo e retirada por incisão prévia. Após, procedido fechamento de alça com prolene 3-0. ​​ Basicamente, foi realizada uma enterolitotomia. Optado pela não realização de colecistectomia e correção da fístula.

Figura 1 – Fotografia particular, obtida no intraoperatório

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2.Discussão

O íleo biliar é caracterizado por um quadro de obstrução mecânica de algum segmento do tubo digestivo por um cálculo biliar, que migra para a luz intestinal através de uma fístula ². O íleo terminal é o local mais frequente de impactação do cálculo, visto que é a área mais estreita do intestino delgado. As fístulas têm origem nas colecistites recorrentes, que geram aderências entre as vias biliares e o intestino, com posterior necrose da parede biliar pela pressão do cálculo 2,4.

A paciente em questão apresentava-se dentro dos parâmetros epidemiológicos clássicos do íleo biliar, como sexo feminino, idade avançada, histórico de colelitíase e múltiplas comorbidades ¹. Além disso, a paciente evoluiu com os sintomas de abdome agudo obstrutivo, como parada de eliminação de fezes e flatos associado a episódios de vômitos, corroborando ainda mais para o diagnóstico de íleo biliar. Alguns pacientes podem apresentar sinais de obstrução intermitentes, ou seja, com períodos de melhora do quadro clínico. Isso sugere o fenômeno de rolagem, denominado tumbling, que acontece pela migração distal do cálculo ¹.

Acerca dos exames de imagem, temos a radiografia de abdome, ultrassonografia de abdome e tomografia de abdome com contraste, que podem auxiliar o diagnóstico¹. Na radiografia de abdome, os achados radiológicos mais frequentes são: visualização de cálculo ectópico, obstrução intestinal e pneumobilia. Esses achados correspondem a tríade de Rigler, sendo que a presença de dois desses achados já é patognomônico de íleo biliar 5,7. ​​ A ultrassonografia de abdome é utilizada para identificar a colelitíase, identificar o cálculo em segmento de alça e distensão abdominal¹. A tomografia computadorizada é o padrão-ouro, sendo possível visualizar a tríade de Rigler em 77% dos casos. Além disso, a colangiorressonância magnética pode ser utilizada, principalmente para detectar cálculos que não foram identificados na tomografia, além de permitir a visualização do trajeto fistuloso 7. A paciente do estudo teve seu diagnóstico pré operatório, visto que apresentava a tríade de Rigler, divergindo da literatura, pois a grande parte dos casos são diagnosticados no intraoperatório.

O objetivo do tratamento na urgência é a resolução da obstrução intestinal. Como epidemiologicamente os pacientes com íleo biliar apresentam múltiplas comorbidades e idade avançada, é discutível a melhor abordagem cirúrgica: enterolitotomia isolada ou associada a abordagem da fístula e colecistectomia². Porém, foi evidenciado que, na cirurgia em um único tempo, há um aumento da morbimortalidade pelo aumento do tempo cirúrgico. Entretanto, reduz o risco de recorrência de íleo biliar, colangite ou carcinoma de vesícula 1,2,5. ​​ A revisão de literatura, realizada por Reisner e Cohen 8, que citam mais de 1000 casos, demonstrou que a cirurgia em um único tempo apresenta uma maior mortalidade (17%) quando comparada à cirurgia em dois tempos (11,7%) ¹,8. A paciente do relato de caso, como era idosa e apresentava múltiplas comorbidades, foi optado pela realização da cirurgia em dois tempos. Ou seja, no contexto da urgência, foi procedido com a enterolitotomia visando retardar o tempo cirúrgico e não agravar as condições clínicas da paciente.

O pós-operatório, na maioria das vezes, é prolongado, sendo que as principais complicações incluem: pneumonia, evisceração e infecção de ferida operatória 1,7. No caso em questão, a paciente cursou com boa evolução clínica e recebeu alta no terceiro dia pós-operatório com seguimento ambulatorial para abordagem cirúrgica em segundo tempo.

 

3.Considerações finais

Apesar de o íleo biliar ser uma causa incomum de obstrução intestinal, deve-se levá-lo em consideração como diagnóstico diferencial principalmente em pacientes idosos e com histórico de colelitíase que evoluem com obstrução intestinal. O tratamento cirúrgico, seja ele em um único tempo ou em dois tempos, deve ser indicado de acordo com as condições clínicas do paciente, visando a diminuição da taxa de morbimortalidade.

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4.Referências

  • Alencastro MC de, Cardoso KT, Mendes CA, Boteon YL, Carvalho RB de, Fraga GP. Abdome agudo por obstrução por ileobiliar. Rev Col Bras Cir. 40(4):275–80, 2013.

  • Ferreira FG, Neto FCR, Souza JR, Leal PB, Bizanha A, Rocha FE. Conservative treatment of biliary ileus in an elderly patient: Case Report. Rev Med Saúde Brasília; 8(2): 140-146, 2019.

  • Guimarães S, Moura JC de, Pacheco Jr AM, Silva RA. Ileo biliar - uma complicação da doença calculosa da vesícula biliar. Rev bras geriatr gerontol.; 13(1):159-163, 2010.

  • Szajnbock I, Lorenzi F, Rodrigues Jr. AJ, Zantut LFC, Poggetti RS, Steinman E, et al.. Gallstone ileus as a cause of upper intestinal obstruction. Sao Paulo Med J; 114(4): 1239-1243, 1996.

  • Cardoso, J. B., Féres, O., & Andrade, J. I. de. Íleo biliar colônico. Revista Do Colégio Brasileiro De Cirurgiões, 26(4), 255–257, 1999.

  • Rodrigues JM da S, Galletti RP, Andrade AV de, Oliveira LFD de, Alvim LB, Ikeda LH, Silva MO de M, Pessoa HA, Blaas SK, Duarte Junior DM. Íleo biliar. Rev. Fac. Ciênc. Méd. Sorocaba, v.9, 2018.

  • Macedo PS, Nunes FS, Bernardina BAFD3 , Natali LD, Khouri JF, Oliveira LGMS, Moitinho GC, Abreu-Santos FHR. Íleo biliar: uma abordagem detalhada no contexto da medicina humana - relato de caso e considerações clínicas. Rev Med (São Paulo). 103(1):e-216905, 2024.

  • Reisner RM, Cohen JR. Gallstone ileus: a review of 1001 reported cases. Am Surg;60(6):441-6, 1994.

     

1

Secretaria de Saúde do Distrito Federal no Hospital Regional de Sobradinho (HRS), Brasília- DF. Brasil.

2

Secretaria de saúde do Distrito Federal, no Hospital Regional de Sobradinho (HRS), Brasília - DF. Brasil.

3

Secretaria de saúde do Distrito Federal, no Hospital Regional de Sobradinho (HRS), Brasília - DF. Brasil.


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